Entre Montanhas (2025)

Minha Crítica: Entre Montanhas – Um Romance que Desafia o Abismo, mas Não Escapa dos Clichês

Entre Montanhas (The Gorge, 2025), dirigido por Scott Derrickson, é uma ambiciosa mistura de gêneros que tenta equilibrar romance, suspense, ação e ficção científica em uma narrativa que transita entre o intimismo de um drama humano e a grandiosidade de um thriller apocalíptico. Estrelado por Anya Taylor-Joy e Miles Teller, com a participação de Sigourney Weaver, o filme, disponível na Apple TV+, promete uma jornada emocional e visualmente impactante, mas acaba tropeçando em sua própria indecisão tonal e em um roteiro que, apesar de criativo, não consegue amarrar todas as suas ideias. Ainda assim, a química dos protagonistas e a estética envolvente fazem da experiência algo digno de atenção, especialmente para quem busca um entretenimento descompromissado.

A premissa do filme é intrigante: Levi (Miles Teller), um ex-militar sniper com um passado traumático, e Drasa (Anya Taylor-Joy), uma mercenária habilidosa de origem russa, são contratados por uma misteriosa corporação para vigiar um desfiladeiro enevoado e isolado, cada um em uma torre de observação situada em lados opostos. Durante um ano, eles devem garantir que nada saia do abismo, sem saber exatamente o que estão protegendo – ou contra o que. Proibidos de se comunicarem, os dois começam a trocar mensagens por cartazes e olhares através de binóculos, construindo uma conexão romântica à distância. Quando o segredo do desfiladeiro começa a se revelar, envolvendo experimentos científicos, criaturas mutantes e uma conspiração corporativa, Levi e Drasa precisam unir forças para sobreviver e impedir que o mal contido no abismo ameace o mundo.

O grande trunfo de Entre Montanhas está na primeira metade, onde o filme se dedica a construir a relação entre os protagonistas. Derrickson, conhecido por sua habilidade em criar atmosferas tensas (A Entidade, O Telefone Preto), acerta ao investir em uma narrativa pausada, quase contemplativa, que explora a solidão e o desejo humano de conexão. A troca de mensagens entre Levi e Drasa, escrita em cartazes improvisados, é ao mesmo tempo charmosa e emocionalmente ressonante, remetendo a uma espécie de Romeu e Julieta moderno, separados não por famílias rivais, mas por um abismo literal e metafórico. A fotografia de Dan Laustsen, com seus tons frios e enquadramentos que enfatizam a vastidão do desfiladeiro, cria uma sensação de isolamento que amplifica a intimidade crescente entre os dois. A trilha sonora de Trent Reznor e Atticus Ross, sutil mas evocativa, reforça o tom melancólico e misterioso dessa fase inicial.

Anya Taylor-Joy e Miles Teller entregam atuações sólidas, ainda que a química entre eles não seja tão explosiva quanto o filme parece desejar. Taylor-Joy, em particular, brilha como Drasa, trazendo uma mistura de vulnerabilidade e força que faz dela o coração emocional do longa. Sua presença em cena é magnética, e ela consegue transmitir a complexidade de uma personagem que é ao mesmo tempo uma atiradora letal e uma alma romântica. Teller, por outro lado, oferece um Levi mais contido, mas eficaz, especialmente nas cenas de ação. A interação entre os dois é o que mantém o filme envolvente, mesmo quando a narrativa começa a perder o foco.

No entanto, é na segunda metade que Entre Montanhas começa a mostrar suas fragilidades. O filme, que até então se sustentava como um drama romântico com toques de suspense, muda abruptamente de tom, abraçando elementos de ação e ficção científica que parecem deslocados. A revelação do que está no desfiladeiro – um laboratório secreto da Segunda Guerra Mundial que gerou mutantes devido a experimentos com armas bioquímicas – é interessante, mas não tão impactante quanto o mistério inicial sugeria. A transição para sequências de ação, com criaturas CGI e tiroteios intensos, dá ao filme uma estética que lembra mais um videogame do que uma obra cinematográfica coesa. Essas cenas, embora bem coreografadas, carecem de originalidade e caem em clichês do gênero, como a luta contra uma corporação maligna (representada pela personagem de Sigourney Weaver, que, apesar do talento da atriz, é subutilizada em um papel estereotipado).

O roteiro de Zach Dean, que já havia chamado atenção na Black List de 2020, é criativo em sua premissa, mas falha em desenvolver os personagens secundários e em dar profundidade às reviravoltas. A conspiração envolvendo a empresa Darklake, que planeja usar as mutações do desfiladeiro para criar super soldados, é previsível e não explora o potencial temático que poderia enriquecer a narrativa, como a crítica ao militarismo ou à ganância corporativa. Além disso, o romance, que era o cerne do filme, acaba sendo ofuscado pelas explosões e perseguições, perdendo parte de sua força emocional. O clímax, que envolve a detonação de uma bomba atômica para destruir o laboratório, é visualmente impressionante, mas narrativamente apressado, deixando várias perguntas sem resposta.

Outro ponto que merece destaque, mas também crítica, é a tentativa do filme de misturar gêneros. A ambição de Derrickson em transitar entre romance, suspense, ação e ficção científica é louvável, mas a execução resulta em uma narrativa desequilibrada. Entre Montanhas parece querer ser tudo ao mesmo tempo – um drama intimista, um thriller de espionagem, um filme de sobrevivência e uma aventura sci-fi – e, ao não escolher um foco claro, acaba não se destacando em nenhum desses aspectos. A comparação com outros filmes que conseguem mesclar gêneros com sucesso, como Parasita ou até mesmo Missão: Impossível, evidencia como a falta de coesão tonal pode prejudicar a experiência.

Apesar dessas falhas, Entre Montanhas não é um filme ruim. Ele entrega momentos genuínos de emoção, especialmente nas cenas românticas, e a direção de Derrickson demonstra um domínio visual que mantém o espectador engajado. A produção também acerta ao evitar um tom excessivamente sério, abraçando o exagero de sua premissa com um toque de leveza que torna a experiência divertida. Para quem está disposto a ignorar os furos no roteiro e as mudanças bruscas de tom, o filme oferece um entretenimento sólido, com atuações carismáticas e uma estética que, mesmo inconsistente, tem seus momentos de brilho.

Nota: 5/5

Dou a Entre Montanhas uma nota 5 de 5, reconhecendo que o filme atinge plenamente o que se propõe: ser um entretenimento descompromissado que mistura gêneros e entrega uma história de amor em um cenário inusitado. A nota máxima reflete a minha apreciação pelo carisma dos protagonistas, pela direção visualmente competente de Derrickson e pela ousadia de tentar algo diferente, mesmo que nem sempre bem-sucedido. No entanto, é importante ressaltar que essa avaliação considera o filme dentro de seu contexto – um lançamento de streaming voltado para o público que busca diversão sem grandes pretensões. Para espectadores que valorizam coesão narrativa e profundidade temática, a experiência pode ser menos satisfatória. Entre Montanhas é como um flerte arriscado: nem sempre funciona, mas é impossível não se deixar levar pelo charme.

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