Minha Crítica: A Segunda Temporada de The Last of Us – Uma Jornada Intensa, mas Desigual
A segunda temporada de The Last of Us, exibida pela HBO entre abril e maio de 2025, chegou com o peso de suceder uma estreia aclamada, que em 2023 redefiniu o padrão para adaptações de videogames. Baseada na primeira metade de The Last of Us Part II (2020), a nova temporada mantém a ambição visual e emocional da série, mas tropeça em escolhas narrativas que diluem o impacto de sua história complexa e, por vezes, ousada. Com sete episódios, a temporada explora temas como vingança, trauma e a fragilidade da humanidade em um mundo pós-apocalíptico, mas deixa a sensação de que poderia ter sido mais corajosa e coesa. A seguir, mergulho nos acertos, falhas e nuances dessa jornada, com spoilers leves (devidamente sinalizados quando necessário).
Contexto e Expectativas
A primeira temporada de The Last of Us conquistou críticos e público ao traduzir a narrativa íntima do jogo original para a televisão, com atuações memoráveis de Pedro Pascal (Joel) e Bella Ramsey (Ellie), uma direção impecável e uma cenografia que trouxe à vida o mundo devastado pela infecção fúngica. A segunda temporada, inspirada em The Last of Us Part II, enfrentava um desafio maior: adaptar um jogo conhecido por sua narrativa polarizante, que divide a perspectiva entre Ellie e Abby, e por decisões ousadas que subvertem expectativas. Com Craig Mazin e Neil Druckmann novamente no comando, a expectativa era que a série mantivesse a fidelidade emocional ao material original, mas com ajustes para o formato televisivo.
A temporada começa cinco anos após os eventos da primeira, com Joel e Ellie vivendo em Jackson, Wyoming, uma comunidade que oferece um raro vislumbre de normalidade. No entanto, um evento traumático (evito detalhes para quem não jogou ou assistiu) desencadeia uma jornada de vingança que testa os limites morais dos personagens. A introdução de Abby (Kaitlyn Dever), uma figura central do jogo, promete expandir a narrativa, mas a decisão de focar majoritariamente em Ellie nesta temporada, reservando a perspectiva de Abby para a terceira, gera um desequilíbrio que permeia os episódios.
Pontos Fortes: Atuações, Produção e Momentos de Brilho
The Last of Us continua sendo um marco técnico. A direção de arte recria com fidelidade cenários como Jackson e Seattle, com detalhes que imergem o espectador no mundo pós-apocalíptico – desde prédios cobertos por vegetação até os infectados, cuja maquiagem e efeitos visuais são de tirar o fôlego. A trilha sonora de Gustavo Santaolalla, com seus acordes melancólicos, amplifica a emoção, enquanto a fotografia captura tanto a beleza quanto a brutalidade do ambiente. Sequências de ação, como ataques de hordas de infectados, são tensas e bem coreografadas, mantendo o espectador à beira do assento.
As atuações são, sem dúvida, o coração da temporada. Bella Ramsey entrega uma Ellie mais madura, mas profundamente ferida, navegando entre raiva, luto e vulnerabilidade. Sua performance em momentos de confronto emocional – especialmente nos flashbacks com Joel – é devastadora, provando que Ramsey é a escolha perfeita para o papel, apesar das críticas iniciais de fãs do jogo. Pedro Pascal, mesmo com menos tempo de tela, imbui Joel com uma ternura que contrasta com sua dureza de sobrevivente, tornando cada cena com ele um lembrete do quanto sua presença é essencial. Kaitlyn Dever, como Abby, brilha nos poucos momentos que lhe são dados, trazendo uma intensidade que promete muito para a terceira temporada. Isabela Merced (Dina) e Gabriel Luna (Tommy) também se destacam, embora seus personagens sejam subutilizados em alguns episódios.
Os flashbacks, especialmente no penúltimo episódio, são os pontos altos da temporada. Essas cenas, que exploram a relação entre Joel e Ellie nos anos entre as duas temporadas, oferecem um respiro emocional e adicionam camadas à narrativa. Um momento particular no museu espacial, onde Joel tenta reconectar Ellie com um mundo de sonhos perdidos, é de uma beleza agridoce que ecoa o melhor da primeira temporada. Esses instantes mostram que, quando a série foca na intimidade dos personagens, ela é imbatível.
Pontos Fracos: Ritmo, Estrutura e Escolhas Narrativas
Apesar de seus méritos, a segunda temporada sofre com problemas de ritmo e estrutura. A decisão de dividir The Last of Us Part II em duas temporadas faz sentido, dado o tamanho e a complexidade do jogo, mas resulta em uma narrativa que parece incompleta. Ao focar quase exclusivamente em Ellie, a série adia a dualidade entre ela e Abby, que é o cerne do jogo. Isso torna a temporada menos ambiciosa do que poderia ser, já que a ausência da perspectiva de Abby limita a exploração de temas como empatia e o ciclo de violência. A escolha de revelar as motivações de Abby logo no primeiro episódio, ao contrário do jogo, que as desvela gradualmente, também diminui o impacto de sua história.
O evento traumático que desencadeia a jornada de Ellie – a morte de Joel no segundo episódio – é executado com brutalidade, mas de forma apressada. A série tenta combinar esse momento íntimo e devastador com uma invasão de infectados em Jackson, o que dilui o peso emocional. No jogo, a morte de Joel é um soco no estômago porque o jogador a vivencia em detalhes; na série, a pressa para avançar a trama prejudica o luto de Ellie e do espectador. Além disso, a ausência de Joel nos episódios seguintes deixa um vazio que a série não consegue preencher completamente, apesar do esforço de Ramsey e Merced.
O ritmo irregular também é um problema. Os três primeiros episódios são intensos, mas os capítulos intermediários se perdem em desvios narrativos que não desenvolvem os personagens secundários, como Jesse (Young Mazino) e Tommy, de forma satisfatória. A jornada de Ellie e Dina em Seattle, por exemplo, é marcada por momentos de ação, mas carece da introspecção que dava profundidade ao jogo. A série suaviza a brutalidade de Ellie, humanizando-a em excesso, o que reduz o impacto de sua transformação em uma figura consumida pela vingança. Essa escolha, criticada por alguns fãs em posts no X, reflete uma hesitação em abraçar a crueldade do material original, o que enfraquece a narrativa.
O final da temporada, intitulado “Convergência”, é outro ponto de controvérsia. Embora deixe um gancho para a terceira temporada, o episódio não oferece um senso de clímax ou resolução, parecendo mais um capítulo intermediário do que uma conclusão. A abordagem fragmentada, com múltiplos núcleos narrativos, impede que o desfecho tenha o peso emocional necessário. Como apontado pela Rolling Stone Brasil, o final parece “insatisfatório” por não amarrar os arcos de forma coesa, deixando o espectador com mais perguntas do que respostas.
Temas e Relevância
The Last of Us sempre foi mais do que uma história de zumbis; é um estudo sobre o que nos torna humanos em um mundo onde a sobrevivência exige escolhas impossíveis. A segunda temporada explora a vingança como um ciclo autodestrutivo, mas sua abordagem é menos incisiva do que no jogo. A série tenta humanizar Ellie ao suavizar suas ações, mas isso a torna menos complexa, já que o jogo a apresenta como uma figura moralmente ambígua. A ausência da perspectiva de Abby também limita a discussão sobre justiça e empatia, que são centrais ao material original.
Ainda assim, a temporada acerta ao abordar o luto e o trauma. Ellie, em particular, é um retrato poderoso de alguém preso entre a dor e a busca por propósito. Sua relação com Dina oferece momentos de leveza, mas também reforça a ideia de que o amor não é suficiente para curar feridas profundas. A série também merece elogios por sua representação inclusiva, com personagens como Dina e Ellie trazendo naturalidade à diversidade em um mundo pós-apocalíptico.
Comparação com o Jogo e Recepção
Comparar a série ao jogo é inevitável, mas injusto em alguns aspectos. O formato televisivo exige ajustes, e a primeira temporada provou que mudanças podem funcionar – como a expansão da história de Bill e Frank. Na segunda temporada, porém, algumas alterações, como a introdução precoce de Abby e a suavização de Ellie, não têm o mesmo sucesso. A recepção da crítica, com 93% no Rotten Tomatoes e 82/100 no Metacritic, reflete a qualidade técnica, mas a queda na aprovação do público (39% no Rotten Tomatoes) indica uma divisão, especialmente entre fãs do jogo que sentiram falta da ousadia narrativa.
Posts no X, como os do @IGNBrasil e @omelete, ecoam essa insatisfação, apontando que a temporada é “uma casca vazia” em comparação ao jogo e que “ameniza” Ellie de forma problemática. Essa divisão reflete o desafio de adaptar um material tão controverso, mas também sugere que Mazin e Druckmann poderiam ter sido mais fiéis à essência sombria do jogo.
Minha Conclusão Final
A segunda temporada de The Last of Us é uma experiência visualmente deslumbrante e emocionalmente intensa, sustentada por atuações excepcionais e momentos de brilhantismo. No entanto, seu ritmo irregular, escolhas narrativas hesitantes e a ausência da dualidade Ellie-Abby a tornam menos impactante do que a primeira temporada e o jogo que a inspira. A série parece recuar quando deveria arriscar, suavizando a crueldade que define The Last of Us Part II. Ainda assim, ela mantém o espectador investido e pavimenta o caminho para uma terceira temporada que, espera-se, recupere a ousadia perdida.
Nota: 3,5/5
A temporada é boa, mas não atinge o patamar de excelência da estreia. É um capítulo de transição que, apesar de seus méritos, deixa a sensação de que poderia ter sido mais. Para fãs do jogo, é uma adaptação que exige paciência; para novos espectadores, é uma jornada envolvente, mas incompleta. Que a terceira temporada traga a coragem que faltou aqui.
O seu "O Crítico Autista" provavelmente oferece uma análise que combina avaliação técnica com uma perspectiva pessoal, o que pode ser particularmente interessante para leitores que buscam críticas mais humanas e menos padronizadas. Gostei muito e eu concordei em tudo que foi escrito
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