Distant (2024)


Minha Crítica ao Filme: Distant (2024) – Uma Jornada Espacial que Promete, mas Não Decola

Distant (2024), dirigido pela dupla Josh Gordon e Will Speck, é uma ambiciosa tentativa de mesclar ficção científica, comédia e drama em uma narrativa centrada em sobrevivência e conexão humana. Estrelado por Anthony Ramos e Naomi Scott, o filme segue a história de Andy Ramirez, um minerador de asteroides que, após um acidente catastrófico, acaba preso em um planeta alienígena hostil. Com oxigênio escasso, caçado por criaturas estranhas e guiado apenas por uma IA defeituosa e pela voz de Naomi Callaway, uma sobrevivente presa em sua cápsula de fuga, Andy enfrenta uma jornada árdua para resgatá-la. Apesar de suas intenções e momentos de brilho, Distant tropeça em sua execução, resultando em uma experiência que é visualmente impressionante, mas narrativamente inconsistente.

Enredo e Temática

A premissa de Distant é intrigante: um homem comum, um engenheiro de mineração espacial, é lançado em um cenário de sobrevivência extrema em um ambiente alienígena. A narrativa explora temas de isolamento, resiliência e a busca por conexão em meio ao desespero. A relação entre Andy e Naomi, construída exclusivamente por meio de comunicações por rádio, evoca paralelos com obras como Gravidade (2013) e Perdido em Marte (2015), onde o isolamento no espaço amplifica o peso emocional das interações humanas. No entanto, o filme tenta equilibrar tons díspares – ação, comédia e drama – e essa ambição acaba sendo sua maior fraqueza.

O roteiro de Spenser Cohen tinha potencial para ser uma história de ficção científica tensa e emocional, mas frequentemente se perde em diálogos expositivos e tentativas de humor que não encontram eco. A comédia, em particular, parece forçada, com piadas que interrompem a tensão dramática em momentos inoportunos. Por exemplo, a IA do traje de Andy, que deveria ser uma fonte de alívio cômico e apoio técnico, muitas vezes soa irritante, com falas que beiram o caricatural. Isso compromete a imersão em um ambiente que deveria transmitir perigo constante.

Atuações

Anthony Ramos entrega uma performance sólida como Andy Ramirez, trazendo carisma e vulnerabilidade ao papel. Ele consegue transmitir o pânico e a determinação de um homem enfrentando circunstâncias impossíveis, especialmente nas cenas em que interage com o ambiente alienígena. Sua química com Naomi Scott, mesmo sendo limitada a interações por voz, é um dos pontos altos do filme. Scott, por sua vez, faz o melhor com um papel restrito, injetando emoção e profundidade em Naomi Callaway, embora o roteiro não explore completamente o passado ou as motivações de sua personagem.

Kristofer Hivju e Zachary Quinto, em papéis secundários, têm presença limitada, mas cumprem suas funções. Hivju, como Dwayne, um colega de Andy, traz um toque de excentricidade que, infelizmente, é subutilizado devido ao desenvolvimento raso do personagem. A crítica recorrente de fãs em fóruns como o Reddit, que apontam Andy como "o menos qualificado para ir ao espaço" devido a decisões impulsivas, reflete uma falha no roteiro em justificar suas ações, o que prejudica a credibilidade de Ramos em certos momentos.

Aspectos Técnicos

Visualmente, Distant é um dos pontos fortes do filme. A cinematografia captura a vastidão desoladora do planeta alienígena, com paisagens áridas e uma paleta de cores que reforça a sensação de isolamento. O design de produção, especialmente o trabalho de Neville Page no design das criaturas, é notável. As criaturas alienígenas, com sua biologia peculiar adaptada a uma atmosfera rica em CO2, são visualmente impressionantes e adicionam um elemento de ameaça crível. O design de som, liderado por Erik Aadahl, é igualmente envolvente, criando uma atmosfera imersiva que intensifica a tensão nas cenas de perseguição.

No entanto, há inconsistências técnicas que minam a suspensão de descrença. Críticas apontam, por exemplo, a implausibilidade de chamas amarelas em um ambiente com apenas 2% de oxigênio, o que contraria a lógica científica que o filme tenta estabelecer. Além disso, a nave acidentada, que sobrevive a um impacto devastador em condições quase intactas, desafia a credibilidade, mesmo dentro do gênero de ficção científica.

Ritmo e Estrutura

O filme, com apenas 1 hora e 27 minutos, é relativamente curto, mas sofre com um ritmo irregular. O início é promissor, estabelecendo rapidamente a premissa e o senso de urgência. O final, com sua resolução emocional, também tem seus méritos. No entanto, a seção intermediária é arrastada, com longas sequências de Andy atravessando o terreno alienígena que se tornam repetitivas. A falta de desenvolvimento mais profundo dos personagens secundários e a dependência excessiva em clichês de ficção científica – como a IA excêntrica e o romance previsível entre os protagonistas – tornam a narrativa menos impactante.

Contexto de Produção e Recepção

Distant enfrentou um caminho tortuoso até seu lançamento. Filmado em 2020 durante a pandemia de COVID-19 em Budapeste, Hungria, o filme sofreu múltiplos adiamentos, com datas de estreia nos EUA marcadas e canceladas repetidamente entre 2022 e 2024. Sua única exibição pública ocorreu no Vietnã, em 12 de julho de 2024, e até janeiro de 2025, não há data confirmada para lançamento nos EUA ou disponibilidade em plataformas de streaming, DVD ou Blu-Ray. Essa falta de distribuição ampla contribuiu para a percepção de que o filme foi "engavetado", possivelmente devido a dúvidas sobre sua viabilidade comercial.

A recepção do público e da crítica tem sido mista. No IMDb, o filme recebeu uma nota média de 5.7/10, com elogios aos efeitos visuais e à química entre Ramos e Scott, mas críticas severas ao roteiro e à narrativa. Comentários em redes sociais, como no Reddit, variam de descrições como "bem divertido" a "absoluta perda de tempo", destacando a polarização em torno do filme. A tentativa de misturar comédia com ficção científica séria foi um ponto de discórdia, com muitos sentindo que o tom cômico comprometeu o potencial de um thriller sci-fi mais impactante.

Comparações e Influências

Distant carrega influências claras de outros clássicos do gênero, como Prometheus (2012), Pitch Black (2000) e Lost in Space. No entanto, enquanto essas obras conseguem equilibrar seus elementos de ação, suspense e exploração científica, Distant parece hesitar em se comprometer com um gênero específico. A comparação com Alien: Romulus (2024), mencionada por fãs, é particularmente reveladora: enquanto a protagonista de Romulus demonstra instinto de sobrevivência, Andy é frequentemente criticado por decisões ilógicas, como não conservar oxigênio ou ignorar ameaças óbvias.

Minha Conclusão Final

Distant é um filme que brilha em seus aspectos técnicos, com efeitos visuais impressionantes e um design de som que cria uma atmosfera envolvente. As atuações de Anthony Ramos e Naomi Scott são pontos positivos, trazendo humanidade a uma história que, infelizmente, é prejudicada por um roteiro inconsistente e um tom que oscila entre comédia e drama sem encontrar um equilíbrio. O filme tinha potencial para ser uma adição memorável ao gênero de ficção científica, mas sua execução deixa a desejar, resultando em uma experiência que diverte em momentos, mas não deixa uma marca duradoura.

Nota: 3/5

A nota reflete os méritos técnicos e as atuações sólidas, mas penaliza o filme pela narrativa irregular, diálogos fracos e falta de profundidade nos personagens secundários. Distant é um filme que vale a pena assistir pelos fãs de ficção científica que apreciam visuais criativos, mas não atende às expectativas de quem busca uma história coesa e emocionalmente impactante.

Como Treinar O Seu Dragão (2025)

Minha Crítica ao Filme: Como Treinar o Seu Dragão (2025) – Um Remake Fiel que Encanta, Mas Não Ousa Voar Alto

Em um cenário onde Hollywood parece cada vez mais refém da nostalgia, os remakes em live-action de animações clássicas tornaram-se uma constante. A DreamWorks, seguindo os passos da Disney, decidiu revisitar uma de suas joias mais queridas, Como Treinar o Seu Dragão (2010), com uma adaptação em live-action lançada em 2025, dirigida por Dean DeBlois, que também comandou a trilogia animada. Com um elenco jovem e promissor liderado por Mason Thames como Soluço e Nico Parker como Astrid, além do retorno de Gerard Butler como Stoico, o filme carrega a pesada missão de honrar um original aclamado enquanto justifica sua própria existência. O resultado é uma obra que emociona pela fidelidade e cuidado, mas que, ao jogar seguro, deixa de explorar o potencial transformador que o formato live-action poderia oferecer. 

A Essência Preservada: Uma História de Empatia e Transformação

A trama de Como Treinar o Seu Dragão (2025) segue quase à risca o roteiro do filme animado de 2010, que, por sua vez, é inspirado livremente na série de livros de Cressida Cowell. Na ilha fictícia de Berk, vikings e dragões vivem em conflito há gerações. Soluço, um jovem franzino e inventivo, é filho do chefe Stoico, mas não se encaixa na cultura guerreira de seu povo. Subestimado pelo pai e ridicularizado pelos pares, ele busca provar seu valor. Tudo muda quando Soluço derruba um Fúria da Noite, o dragão mais temido, mas, em vez de matá-lo, decide libertá-lo e forma uma amizade improvável com a criatura, batizada de Banguela. Essa conexão revela a verdadeira natureza dos dragões, desafiando tradições vikings e levando Soluço, com a ajuda da feroz Astrid e do excêntrico ferreiro Bocão (Nick Frost), a tentar unir dois mundos em conflito.

O coração da história permanece intacto: é uma narrativa sobre empatia, aceitação e coragem para questionar dogmas. A jornada de Soluço ressoa como um coming-of-age universal, enquanto sua relação com Banguela simboliza a superação de preconceitos. A adaptação mantém essas camadas temáticas, reforçando mensagens sobre inclusão e a redefinição de heroísmo. No entanto, ao optar por uma recriação quase literal, o filme não aprofunda essas ideias nem as atualiza para o contexto contemporâneo, o que poderia ter dado frescor à narrativa.

Fidelidade como Virtude e Limitação

Dean DeBlois, que também assina o roteiro, demonstra um carinho evidente pelo material original. A fidelidade é o maior trunfo do filme, especialmente para os fãs da animação. Cenas icônicas, como o primeiro contato entre Soluço e Banguela, são recriadas com uma precisão quase quadro a quadro, preservando a emoção e a cadência do original. A sequência em que Soluço toca Banguela pela primeira vez, por exemplo, é tão delicada e poderosa quanto na animação, ganhando força extra pela expressividade de Mason Thames e pelos efeitos visuais que tornam o dragão crível sem perder sua fofura característica.

Essa abordagem, porém, é uma faca de dois gumes. A fidelidade garante um reencontro nostálgico, mas limita a capacidade do filme de se destacar como uma obra autônoma. Diferentemente de remakes como Mogli: O Menino Lobo (2016), que reimaginou a animação com um tom mais sombrio e realista, Como Treinar o Seu Dragão (2025) não se arrisca a explorar novas perspectivas narrativas ou visuais. O terceiro ato, em particular, segue a mesma estrutura previsível do original, com a batalha contra a Morte Rubra se desenrolando de forma dinâmica, mas sem surpresas. Para um público que já conhece a história, a falta de ousadia pode gerar uma sensação de déjà-vu.

Um Elenco que Dá Vida a Berk

O elenco é um dos pontos altos do filme. Mason Thames entrega um Soluço cativante, capturando a vulnerabilidade e a obstinação do personagem com uma naturalidade que remete ao Tom Holland de Homem-Aranha. Sua química com Nico Parker, que interpreta Astrid, é convincente, evocando a dinâmica de respeito mútuo e romance nascente vista na animação. Parker traz uma Astrid mais emocionalmente acessível, mas igualmente forte, o que adiciona nuances ao papel.

Gerard Butler, reprisando Stoico, é um destaque à parte. Após dublar o personagem na trilogia animada, ele agora incorpora o chefe viking com uma presença física imponente, mas também com uma vulnerabilidade que humaniza o líder rígido. A relação entre Stoico e Soluço, marcada por desencontros e reconciliação, ganha peso com a atuação de Butler, especialmente nas cenas de conflito e redenção. Nick Frost, como Bocão, injeta humor e carisma, enquanto os coadjuvantes, como Julian Dennison (Perna-de-Peixe) e Gabriel Howell (Melequento), cumprem bem seus papéis, embora os personagens secundários tenham menos espaço para brilhar em comparação com a animação.

Visuais e Efeitos: A Magia de Berk em Live-Action

Visualmente, o filme é um triunfo. A ilha de Berk é recriada com detalhes impressionantes, desde as paisagens rochosas até as casas vikings cobertas de musgo. A fotografia de Nigel Bluck explora tons terrosos e marítimos, criando uma atmosfera que lembra O Senhor dos Anéis em sua escala épica, mas com um toque mais caloroso e acessível. Os efeitos práticos usados para compor o cenário, combinados com o CGI dos dragões, conferem verossimilhança ao universo. Banguela, em particular, é uma conquista técnica: seus olhos expressivos e movimentos caninos mantêm o charme da animação, enquanto a textura de sua pele e o realismo de seu voo o tornam palpável.

As cenas de voo são o ápice visual do filme. Coreografadas com dinamismo e embaladas pela trilha sonora de John Powell, que retorna com uma versão revisitada de sua icônica partitura, essas sequências capturam a sensação de liberdade e aventura que definiu a animação. No entanto, o design de alguns elementos, como os figurinos, poderia ter sido mais ousado. As roupas dos vikings, embora funcionais, não refletem plenamente a diversidade cultural ou as personalidades dos personagens, uma oportunidade perdida para enriquecer o mundo visual.

Trilha Sonora e Ritmo: Nostalgia com Toques de Modernidade

John Powell, cuja trilha original de 2010 foi indicada ao Oscar, retorna com uma partitura que mistura temas clássicos com novos arranjos. Músicas como “Test Drive” reaparecem em momentos-chave, reforçando a nostalgia, enquanto novas composições adicionam frescor às cenas de batalha e exploração. A trilha é um dos elementos que mais conecta o remake ao original, funcionando como uma ponte emocional para os fãs.

O ritmo do filme, no entanto, sofre com a duração de 2 horas e 5 minutos, cerca de 30 minutos mais longo que a animação. Embora o tempo extra permita maior desenvolvimento da relação entre Soluço e Banguela, algumas cenas, especialmente no segundo ato, se arrastam, com diálogos expositivos que poderiam ter sido condensados. O terceiro ato, por outro lado, é dinâmico, mas sua previsibilidade reduz o impacto emocional para quem já conhece o desfecho.

O Dilema do Remake: Necessidade Versus Paixão

A grande questão que paira sobre Como Treinar o Seu Dragão (2025) é: por que ele existe? A animação original, lançada há apenas 15 anos, permanece fresca na memória cultural, com uma trilogia completa, séries animadas e uma base de fãs apaixonada. Diferentemente de contos clássicos como Cinderela, que atravessam gerações, a história de Soluço e Banguela não precisava de uma “atualização”. DeBlois, em entrevistas, admitiu sua relutância inicial em fazer o remake, aceitando o projeto para proteger a integridade da obra original. Essa postura explica a abordagem conservadora, mas também evidencia a falta de um propósito criativo claro.

Ainda assim, o filme não é apenas um caça-níqueis cínico. Há paixão em sua execução, visível no cuidado com os dragões, nas atuações e na recriação de Berk. Para um público novo, especialmente crianças que não cresceram com a animação, o live-action pode ser uma porta de entrada encantadora para esse universo. Para os fãs, é um reencontro carinhoso, mas que não acrescenta muito além da nostalgia.

Minha Conclusão Final: Um Voo Seguro, Mas Não Memorável

Como Treinar o Seu Dragão (2025) é um remake competente, visualmente deslumbrante e emocionalmente eficaz, que honra a animação original com uma fidelidade quase reverente. Mason Thames e Gerard Butler ancoram a narrativa com atuações sensíveis, enquanto os efeitos visuais e a trilha de John Powell recriam a magia de Berk. No entanto, ao priorizar a segurança em detrimento da inovação, o filme não alcança o impacto transformador de seu predecessor animado. É uma adaptação que aquece o coração, mas não ousa voar tão alto quanto Banguela.

Nota: 3,5/5

O filme é um sucesso em capturar a essência da história, mas perde pontos pela falta de ousadia e por uma duração que nem sempre justifica seu ritmo. Recomendado para fãs da franquia e para quem busca uma aventura familiar sólida, mas aqueles que esperam uma reinvenção podem se sentir frustrados. Com uma sequência confirmada para 2027, há esperança de que a franquia encontre um caminho mais autoral nos próximos capítulos.

Until Dawn: Noite de Terror (2025)

Minha Crítica: Until Dawn - Noite de Terror (2025)

O cinema de terror vive um momento peculiar, onde adaptações de videogames tentam encontrar seu espaço entre a fidelidade ao material original e a necessidade de funcionar como uma obra independente. Until Dawn: Noite de Terror, dirigido por David F. Sandberg, entra nesse ringue com a promessa de transformar o aclamado jogo de 2015 da Supermassive Games em uma experiência cinematográfica que honre sua essência, mas também traga algo novo. O resultado, porém, é uma mistura ambiciosa, mas irregular, que oscila entre momentos de diversão despretensiosa e tropeços narrativos que deixam o espectador com a sensação de que o filme poderia ter sido mais.

A trama segue Clover (Ella Rubin), uma jovem atormentada pelo desaparecimento de sua irmã, Melanie, ocorrido há um ano. Junto com um grupo de amigos – Max (Michael Cimino), Nina (Ji-young Yoo), Megan (Odessa A’zion) e Abe (Belmont Cameli) – ela retorna ao remoto Vale Glore, onde Melanie foi vista pela última vez. O grupo se abriga em um centro de visitantes abandonado, mas logo descobre que está preso em um loop temporal sobrenatural: cada noite, eles são caçados por diferentes ameaças, de assassinos mascarados a criaturas grotescas, e ao morrerem, acordam no início da mesma noite. Para escapar, precisam sobreviver até o amanhecer, mas com um número limitado de “vidas”.

O filme se apresenta como uma “carta de amor ao gênero de terror”, e nisso, pelo menos, é honesto. Sandberg, conhecido por Quando as Luzes se Apagam e Annabelle 2, demonstra familiaridade com os tropos do horror, utilizando o loop temporal para explorar diversos subgêneros: slasher, sobrenatural, gore e até found footage. Cada noite traz uma nova ameaça, como se o filme fosse uma antologia condensada, e essa abordagem cria sequências criativas de mortes – muitas delas violentas e visualmente impactantes, com destaque para os efeitos práticos que reforçam o tom visceral. Há um prazer quase sádico em ver os personagens enfrentarem perigos variados, desde machadadas na cabeça até explosões corporais, e o filme não tem vergonha de abraçar o trash, o que pode ser um ponto forte para quem busca diversão descompromissada.

No entanto, a ambição de Until Dawn em ser tantas coisas ao mesmo tempo é também sua maior fraqueza. A narrativa tenta equilibrar o horror com um drama psicológico centrado na culpa e na busca de Clover por respostas sobre a irmã, mas esses elementos emocionais ficam subdesenvolvidos. Os personagens, apesar de bem interpretados – Ella Rubin entrega uma performance sólida, com momentos de fragilidade e desespero convincentes –, são arquétipos típicos do gênero: a protagonista traumatizada, o ex-namorado arrependido, a amiga cética, o medroso cômico. Essa falta de profundidade faz com que o espectador se importe mais com as mortes criativas do que com o destino emocional do grupo, o que enfraquece o impacto da história.

A relação com o jogo original é outro ponto de discórdia. Diferente de adaptações como The Last of Us, que buscam recriar a narrativa do game, Until Dawn opta por uma história original no mesmo universo, mantendo apenas referências sutis, como a presença do Dr. Hill (Peter Stormare, reprisando seu papel do jogo, mas em uma versão mais enigmática) e easter eggs, como a cabana nevada vista no final. Essa escolha é compreensível – o jogo já é uma experiência cinematográfica interativa, e uma adaptação literal poderia parecer redundante –, mas frustra quem esperava ver elementos icônicos, como a trama de vingança ou a mitologia dos Wendigos, mais presentes. O loop temporal, inspirado em filmes como A Morte Te Dá Parabéns e No Limite do Amanhã, é uma adição interessante, mas por vezes parece forçado, como se o filme estivesse tentando se distanciar demais do material-base para justificar sua existência.

Visualmente, o filme tem méritos. Sandberg usa a ambientação do Vale Glore – um misto de floresta claustrofóbica e instalações abandonadas – para criar uma atmosfera opressiva, reminiscente de clássicos do terror dos anos 2000. A fotografia de Maxime Alexandre alterna entre tons frios e sombras densas, enquanto a trilha de Benjamin Wallfisch amplifica a tensão, embora caia em clichês em alguns momentos. Os efeitos práticos, como já mencionado, são um destaque, mas o CGI, usado em criaturas e cenas mais fantásticas, varia de qualidade, às vezes quebrando a imersão.

O roteiro, escrito por Blair Butler e Gary Dauberman, é outro aspecto que divide. Por um lado, ele acerta ao não se levar muito a sério, inserindo humor em doses certas – algumas falas de Max provocam risadas genuínas, mesmo que beirem o cringe. Por outro, a narrativa se perde na própria repetição. As primeiras noites são envolventes, mas conforme o filme avança, a falta de explicações claras sobre o loop temporal e a mitologia do vale começa a frustrar. O final, embora amarre algumas pontas e deixe ganchos para uma possível sequência, é anticlimático, com revelações que não surpreendem tanto quanto prometem.

Until Dawn: Noite de Terror é, no fim das contas, um filme que diverte, mas não transcende. Ele funciona como um passatempo para fãs de terror que apreciam clichês bem executados e mortes inventivas, mas decepciona como adaptação por se afastar demais do jogo e não oferecer uma narrativa tão memorável quanto o original. Sandberg mostra talento para o gênero, e o elenco jovem carrega o filme com energia, mas a falta de ousadia em explorar a mitologia e a superficialidade dos personagens impedem que o longa alcance seu potencial. É um slasher moderno com toques de sci-fi que entrega sustos e gore, mas deixa a sensação de que, assim como seus personagens, ficou preso em um ciclo que não soube como quebrar completamente.

Nota: 3/5

Os Exterminadores do Além Contra a Loira do Banheiro (2018)

Minha Crítica ao Filme: Os Exterminadores do Além Contra a Loira do Banheiro – Uma Mistura de Terrir, Nostalgia e Exagero que Divida Opiniões

Lançado em 29 de novembro de 2018, Os Exterminadores do Além Contra a Loira do Banheiro é uma comédia de terror brasileira dirigida por Fabrício Bittar e roteirizada por ele, Danilo Gentili e André Catarinacho. Protagonizado por um elenco de humoristas conhecidos do público brasileiro, como Danilo Gentili, Léo Lins, Murilo Couto e Dani Calabresa, o filme se propõe a misturar o subgênero “terrir” (terror cômico) com uma estética inspirada nos clássicos trash dos anos 80 e 90, como Os Caça-Fantasmas e as obras de Sam Raimi. Com uma premissa que explora a lenda urbana da Loira do Banheiro, o longa mergulha em um universo de humor escatológico, gore exagerado e referências pop, mas tropeça em sua própria ambição, resultando em uma experiência que diverte em momentos específicos, mas carece de consistência narrativa e profundidade. A seguir, uma análise detalhada de seus elementos, acertos e falhas.

Enredo e Contexto Cultural

A trama acompanha um grupo de youtubers fracassados – Jack (Danilo Gentili), Fred (Léo Lins), Caroline (Dani Calabresa) e Túlio (Murilo Couto) – que se autoproclamam “exterminadores de assombrações” e veem na investigação de uma suposta possessão demoníaca em uma escola a chance de viralizar na internet e conquistar um piloto para a TV. O caso envolve a Loira do Banheiro, uma lenda urbana brasileira que assombra banheiros escolares, aqui reimaginada como uma entidade vingativa e sanguinária. A narrativa começa com um tom de sátira metalinguística, brincando com a cultura de influenciadores digitais e a febre de vídeos virais, mas logo se entrega a um festival de piadas escatológicas e cenas gore.

O filme acerta ao se conectar com o imaginário brasileiro, utilizando a Loira do Banheiro, uma figura folclórica que evoca nostalgia para quem cresceu ouvindo histórias de terror nas escolas. Além disso, a escolha de ambientar a história no contexto de youtubers reflete o zeitgeist de 2018, quando a busca por cliques e relevância online dominava a cultura jovem. No entanto, o roteiro não capitaliza essas ideias de forma consistente, optando por uma abordagem exagerada que prioriza o choque pelo choque, em detrimento de uma narrativa mais coesa ou de uma sátira mais afiada.

Direção e Estética

Fabrício Bittar demonstra um claro carinho pelo cinema trash oitentista, com referências visuais e narrativas a filmes como Evil Dead e Ghostbusters. A direção investe em efeitos práticos, com sangue jorrando em quantidades absurdas, maquiagens exageradas e criaturas grotescas, como um feto possuído que protagoniza uma das cenas mais bizarras do longa. Esses elementos conferem ao filme um charme tosco, que pode agradar fãs do gênero B. A fotografia e a edição, embora limitadas pelo orçamento, criam uma atmosfera convincente em algumas sequências, especialmente nas cenas noturnas na escola, que misturam suspense e humor.

Por outro lado, a direção peca em momentos de ação, com cortes rápidos e uma câmera “nervosa” que tornam algumas cenas confusas e difíceis de acompanhar. Além disso, o ritmo do filme é irregular: o primeiro ato é promissor, com uma introdução divertida dos personagens e do conflito, mas o segundo ato se arrasta com piadas repetitivas e situações que não avançam a trama. O terceiro ato recupera parte da energia, com um clímax que abraça o absurdo, mas não é o suficiente para compensar os momentos de monotonia.

Roteiro e Humor

O roteiro, assinado por Bittar, Gentili e Catarinacho, é o ponto mais fraco do filme. Embora a premissa seja criativa, a execução é inconsistente, com diálogos que oscilam entre o intencionalmente cafona e o simplesmente mal escrito. O humor é predominantemente escatológico, com piadas envolvendo fezes, camisinhas e fluidos corporais, o que pode funcionar para um público específico, mas cansa rapidamente pela falta de variedade. Algumas sequências, como a luta contra o feto possuído ou a cena em que uma personagem aparece com uma camisinha no rosto, se estendem além do necessário, perdendo o timing cômico.

O filme também flerta com temas polêmicos, como pedofilia e misoginia, mas sua abordagem é superficial, usando esses elementos mais para provocar do que para oferecer uma crítica ou desconstrução. Essa escolha reflete a persona de Danilo Gentili, que se posiciona como um defensor do humor “sem limites”, mas o resultado é um filme que soa mais tolo do que provocador, como apontado por críticos como Bruno Carmelo, do AdoroCinema. A metalinguagem, que poderia enriquecer a narrativa, fica restrita a referências óbvias e piadas internas que só fazem sentido para quem conhece o elenco, como as participações especiais de Sikêra Jr. e Ratinho.

Elenco e Atuações

O elenco é composto majoritariamente por humoristas, o que confere ao filme uma energia espontânea, mas também expõe limitações na atuação. Danilo Gentili interpreta uma versão exagerada de si mesmo, com trejeitos que remetem ao seu programa The Noite, mas sua performance carece de nuances. Léo Lins e Dani Calabresa têm momentos divertidos, mas seus personagens são subutilizados, especialmente Caroline, que desaparece da trama de forma abrupta. Murilo Couto, como Túlio, é o destaque, trazendo um carisma natural e um arco que, embora simples, oferece alguma profundidade ao grupo.

Entre os coadjuvantes, Bárbara Bruno se sobressai com uma atuação comprometida, mesmo em cenas absurdas, enquanto Sikêra Jr. surpreende como o diretor Nogueira, com um tom autoritário que parece improvisado e adiciona humor à narrativa. No entanto, outros personagens secundários, como os professores interpretados por Antônio Tabet e Renata Gaspar, são desperdiçados em subtramas que não contribuem para o enredo.

Aspectos Técnicos

Apesar do orçamento limitado, típico de produções nacionais, Os Exterminadores do Além impressiona em alguns aspectos técnicos. A maquiagem e os efeitos práticos são competentes, criando visuais impactantes dentro do estilo trash. A trilha sonora e a edição de som, com jumpscares previsíveis mas eficazes, ajudam a criar uma atmosfera de tensão em momentos pontuais. No entanto, a mixagem de som ocasionalmente falha, com diálogos abafados em cenas mais caóticas.

Recepção e Impactos 

O filme dividiu críticos e público. Enquanto alguns elogiaram sua ousadia e fidelidade ao gênero trash, outros o consideraram apelativo e mal executado. No AdoroCinema, a média das críticas dos usuários é de 3,6 estrelas, contrastando com as 2 estrelas da crítica profissional. No IMDb, a nota é 5,6, refletindo uma recepção mista, mas com elogios à sua energia cômica e ao gore exagerado. O longa também ganhou prêmios em festivais internacionais, como o Macabro Film Festival, indicando que encontrou seu nicho entre fãs de terror cômico.

No contexto do cinema brasileiro, Os Exterminadores do Além é uma tentativa louvável de explorar um gênero pouco comum no país, que raramente investe em terror ou comédia de horror. Comparado a obras como as de Zé do Caixão, o filme não tem a mesma profundidade temática, mas cumpre seu papel como entretenimento despretensioso. Sua maior contribuição é abrir espaço para produções que fogem do padrão das comédias românticas ou dramas sociais, ainda que não alcance todo o seu potencial.

Minhas Considerações Finais

Os Exterminadores do Além Contra a Loira do Banheiro é um filme que abraça o exagero e a irreverência, mas não consegue sustentar sua proposta ao longo de seus 108 minutos. Para fãs de humor escatológico e terror trash, o longa oferece momentos de diversão, com destaque para o gore criativo, as participações especiais e o carisma de Murilo Couto. No entanto, o roteiro irregular, as piadas repetitivas e a falta de profundidade limitam seu alcance, tornando-o uma experiência mais memorável pelo absurdo do que pela qualidade narrativa.

Nota: 3/5

O filme merece crédito por sua ousadia e por trazer algo diferente ao cinema brasileiro, mas fica aquém de ser uma obra verdadeiramente marcante. É um passatempo divertido para quem está disposto a desligar o cérebro e embarcar na loucura, mas não resiste a uma análise mais crítica.

Bailarina - Do Universo de John Wick (2025)

Minha Crítica ao Filme: Bailarina – Do Universo de John Wick (2025)

O universo de John Wick, criado por Chad Stahelski e Derek Kolstad, é um fenômeno que redefiniu o cinema de ação contemporâneo. Com sua mistura de mitologia intricada, coreografias de luta impecáveis e um estilo visual que equilibra elegância e brutalidade, a franquia conquistou uma legião de fãs ao longo de quatro filmes. Bailarina – Do Universo de John Wick, dirigido por Len Wiseman e estrelado por Ana de Armas, é a primeira incursão cinematográfica derivada da série principal, prometendo expandir o mundo dos assassinos profissionais com uma nova protagonista. Ambientado entre os eventos de John Wick 3: Parabellum e John Wick 4: Baba Yaga, o filme apresenta Eve Macarro, uma jovem treinada pela organização Ruska Roma em busca de vingança pela morte de seu pai. Apesar de suas qualidades técnicas e da performance magnética de Ana de Armas, Bailarina tropeça ao tentar equilibrar sua identidade própria com a sombra imponente do legado de John Wick, resultando em uma experiência que é, ao mesmo tempo, empolgante e frustrantemente genérica.

Enredo e Contexto

A trama de Bailarina é, em essência, uma história de vingança clássica. Eve Macarro (Ana de Armas), ainda criança, testemunha o assassinato brutal de seu pai por uma organização criminosa misteriosa. Órfã, ela é acolhida pela Ruska Roma, uma facção que opera dentro do universo de John Wick, onde é treinada em uma academia de balé que funciona como fachada para formar assassinas letais. Anos depois, Eve embarca em uma missão pessoal para vingar seu pai, enfrentando adversários formidáveis e descobrindo segredos sobre sua própria história. A narrativa se conecta ao universo maior por meio de participações de personagens icônicos, como Winston (Ian McShane), Charon (Lance Reddick, em uma aparição póstuma comovente) e o próprio John Wick (Keanu Reeves), cuja presença é usada para situar o filme na linha do tempo da franquia.

Embora a premissa seja familiar, o roteiro de Shay Hatten (John Wick 3 e 4) tenta injetar frescor ao explorar a dualidade entre a delicadeza do balé e a violência desenfreada de Eve. No entanto, a promessa de integrar o balé como um elemento central da narrativa não se concretiza plenamente. A ideia de uma escola de assassinas disfarçada de academia de dança é fascinante, mas o filme não mergulha profundamente nesse conceito, utilizando-o mais como um pano de fundo estilizado do que como um motor narrativo. A história, por sua vez, segue uma estrutura previsível, com momentos de exposição que tentam amarrar Bailarina à mitologia de John Wick, mas que muitas vezes soam forçados ou redundantes.

Direção e Estilo Visual

Len Wiseman, conhecido por Anjos da Noite e O Vingador do Futuro, assume a direção com uma abordagem que busca honrar o DNA da franquia, mas carece da precisão autoral de Chad Stahelski. As sequências de ação, supervisionadas em parte por Stahelski (que também atua como produtor), são o ponto alto do filme. Wiseman entrega cenas de combate vibrantes e criativas, com destaque para momentos como a luta com um lança-chamas em um cenário gelado e uma sequência que mistura granadas e improvisos cômicos com objetos cotidianos, como pratos e eletrodomésticos. A coreografia de Eve é distinta da de John Wick: enquanto o Baba Yaga é metódico e preciso, Eve é impulsiva, adaptável e caótica, usando o ambiente a seu favor de maneira inventiva. Essa diferenciação confere ao filme uma identidade própria, ainda que não totalmente explorada.

Visualmente, Bailarina mantém a estética neo-noir que define a franquia, com uma paleta de cores que alterna entre tons frios e quentes, reforçando o contraste entre a frieza do mundo dos assassinos e a paixão de Eve por sua vingança. A direção de fotografia de Romain Lacourbas é competente, com enquadramentos que valorizam a fisicalidade das lutas, embora não alcance o mesmo nível de sofisticação dos planos aéreos e sequências sem cortes que Stahelski tornou marca registrada da série. Há momentos em que a mise-en-scène de Wiseman parece menos inspirada, com enquadramentos genéricos que não exploram todo o potencial do cenário ou da ação.

Atuações e Personagens

Ana de Armas é, sem dúvida, o coração pulsante de Bailarina. Sua performance é um equilíbrio impressionante de vulnerabilidade e ferocidade. Eve é uma protagonista que carrega o peso de seu trauma, mas também uma determinação quase feral, traduzida em sequências de ação que exigiram um treinamento físico intenso da atriz. De Armas não apenas cumpre as exigências do papel, mas também injeta carisma e humanidade em uma personagem que poderia facilmente cair no estereótipo da “assassina durona”. Sua habilidade de transitar entre momentos de fragilidade emocional e explosões de violência é um dos maiores trunfos do filme, provando que ela está pronta para carregar uma franquia de ação.

O elenco de apoio, embora repleto de nomes de peso, é subutilizado. Anjelica Huston retorna como a Diretora da Ruska Roma, trazendo uma presença imponente, mas com tempo de tela limitado. Ian McShane e Lance Reddick oferecem continuidade ao universo, mas suas participações são mais funcionais do que essenciais. Keanu Reeves, por sua vez, aparece em momentos estratégicos que servem como fan service, mas sua presença, embora bem-vinda para os fãs, às vezes parece uma muleta narrativa, como se os produtores temessem que o filme não se sustentasse sem o Baba Yaga. Outros atores, como Norman Reedus e Gabriel Byrne, têm papéis secundários que não deixam marca significativa, com arcos que se perdem na edição ou não recebem o desenvolvimento necessário.

Pontos Fortes e Fraquezas

Bailarina brilha quando se concentra na ação e na construção de Eve como uma nova força no universo de John Wick. As sequências de combate são inventivas e bem executadas, com destaque para o terceiro ato, onde o filme encontra seu ritmo e entrega um espetáculo visual que rivaliza com os melhores momentos da franquia. A trilha sonora de Tyler Bates e Joel J. Richard complementa a ação com batidas pulsantes que amplificam a energia das cenas.

No entanto, o filme sofre com uma narrativa que não ousa o suficiente. A história de vingança é genérica e não explora profundamente as nuances da mitologia da Ruska Roma ou do universo maior. A tentativa de conectar Bailarina aos eventos de John Wick resulta em momentos que parecem forçados, como se o filme tivesse medo de se desvencilhar completamente do legado de seu antecessor. Além disso, a primeira metade do longa é irregular, alternando entre sequências de ação empolgantes e momentos expositivos que carecem de profundidade emocional. A falta de um vilão memorável também é um ponto fraco: o Chanceler de Gabriel Byrne é funcional, mas não tem o impacto de antagonistas como o Marquês de John Wick 4.

Impacto e Legado

Bailarina é um passo cauteloso na expansão do universo de John Wick. Embora não alcance o mesmo nível de excelência dos filmes dirigidos por Stahelski, o longa prova que há espaço para novas histórias e protagonistas na franquia. Ana de Armas demonstra potencial para liderar uma sequência, e a introdução da Kikimora como uma figura mitológica paralela ao Baba Yaga abre possibilidades interessantes para o futuro. Contudo, o filme também expõe os desafios de criar um derivado que seja ao mesmo tempo fiel à franquia e inovador. A dependência de conexões com John Wick e a falta de ousadia narrativa sugerem que a Lionsgate ainda está tateando o terreno para encontrar o equilíbrio ideal.

Em termos comerciais, Bailarina teve um desempenho modesto, arrecadando cerca de US$ 24,5 milhões em seu fim de semana de estreia nos EUA, aquém das expectativas para um filme com orçamento estimado em US$ 90 milhões. A concorrência com outros blockbusters de verão, como Missão: Impossível – O Acerto Final, pode ter contribuído para esse resultado. Ainda assim, a recepção crítica tem sido majoritariamente positiva, com 77% de aprovação no Rotten Tomatoes, destacando a ação e a performance de De Armas, mas apontando a falta de originalidade como um obstáculo.

Minha Conclusão Final 

Bailarina – Do Universo de John Wick é um filme de ação competente que entrega o que promete: sequências de luta empolgantes, uma protagonista carismática e vislumbres do universo que os fãs adoram. Ana de Armas carrega o filme com uma performance física e emocional que a estabelece como uma estrela de ação, mas a narrativa genérica e a hesitação em se afastar da sombra de John Wick limitam seu impacto. Len Wiseman faz um trabalho sólido, mas sua direção não tem a mesma visão autoral que tornou a franquia principal um marco do gênero. Para os fãs de John Wick, Bailarina é uma adição divertida e cheia de adrenalina, mas aqueles que esperavam uma evolução mais ousada do universo podem sair com a sensação de que o filme dança bem, mas não escolhe sua própria coreografia.

Nota: 3/5

Em resumo, a nota 3/5 reflete um filme que é divertido, tecnicamente bem-feito e beneficiado pela performance de Ana de Armas, mas que peca pela falta de ousadia, narrativa genérica e dependência excessiva da franquia original. É uma adição válida ao universo.

Confinado (2025)

Minha Crítica do filme Confinado (2025)

Confinado (Locked, 2025), dirigido por David Yarovesky e estrelado por Bill Skarsgård e Anthony Hopkins, é uma refilmagem do suspense argentino 4x4 (2019), que também inspirou a produção brasileira A Jaula (2022). O filme, produzido por Sam Raimi e distribuído pela Diamond Films, propõe um thriller psicológico claustrofóbico que explora temas como justiça, moralidade, desigualdade social e vingança, ambientado quase inteiramente dentro de um SUV de luxo transformado em uma armadilha tecnológica. Apesar de sua premissa intrigante, atuações competentes e momentos de tensão bem executados, Confinado tropeça em sua ambição, entregando um resultado que oscila entre o promissor e o frustrante, incapaz de explorar plenamente o potencial de sua narrativa ou de seus temas.

Enredo e Contexto

A trama acompanha Eddie Barrish (Bill Skarsgård), um pai em dificuldades financeiras que vive de pequenos golpes e furtos para sustentar sua filha, Sarah, e manter alguma dignidade em um mundo que o pressiona constantemente. Em um momento de desespero, Eddie vê uma oportunidade ao encontrar um SUV de luxo, o "Dolus" — uma versão customizada de um Land Rover Defender, projetada com detalhes impressionantes e um custo de produção de 1,3 milhão de dólares, segundo informações do IMDb. O que parece um golpe fácil se transforma em um pesadelo quando Eddie descobre que o veículo é uma armadilha mortal, controlada remotamente por William (Anthony Hopkins), um médico rico e autoproclamado justiceiro que usa a tecnologia para punir criminosos com sua visão distorcida de justiça.

Inspirado em um caso real ocorrido em Córdoba, Argentina, em 2016, onde um assaltante ficou preso em um carro equipado com um sistema de segurança avançado, Confinado utiliza essa premissa para construir um jogo de gato e rato psicológico. Eddie, preso no carro, enfrenta torturas físicas e psicológicas impostas por William, enquanto tenta sobreviver e proteger sua família, que também se torna alvo do "justiceiro". A narrativa promete explorar a tensão entre desigualdade social, moralidade e vingança, mas frequentemente se perde em clichês e resoluções simplistas.

Aspectos Técnicos

A direção de Yarovesky, conhecido por Brightburn – Filho das Trevas (2019), demonstra habilidade em trabalhar com limitações espaciais. A fotografia, com cores frias e ângulos fechados, amplifica a sensação de claustrofobia, enquanto a montagem ágil evita que a experiência se torne monótona, mesmo com a ação restrita ao interior do veículo. O design do "Dolus" é um destaque à parte: o SUV, com vidros escurecidos, couro bege e um brasão da Senhora Justiça, é tanto um símbolo de poder quanto uma prisão tecnológica, funcionando como um personagem por si só. A trilha sonora, minimalista, complementa a atmosfera sem roubar a atenção, mas não se destaca como elemento memorável.

No entanto, a execução técnica não é suficiente para compensar as falhas do roteiro, assinado por Michael Arlen Ross. A narrativa repete dilemas e diálogos de forma exaustiva — como a troca recorrente entre Eddie perguntando "o que você quer de mim?" e William respondendo "quero que você entenda". Essa repetição, combinada com uma transição abrupta para sequências de ação no ato final, prejudica o ritmo e a coesão da história. O filme abandona a tensão psicológica inicial em favor de um desfecho mais convencional, com elementos de torture porn que parecem fora de lugar, como apontado por algumas críticas.

Atuações

Bill Skarsgård entrega uma atuação sólida como Eddie, capturando a frustração e o desespero de um homem comum preso em circunstâncias extraordinárias. Sua fisicalidade intensa e expressividade facial conseguem transmitir a angústia de alguém lutando pela sobrevivência, mesmo quando o roteiro o limita a um personagem unidimensional. A tentativa de humanizar Eddie — como na cena em que ele oferece água a um cachorro preso em um carro — é um esforço louvável, mas não suficiente para dar profundidade ao personagem.

Anthony Hopkins, por outro lado, parece estar em um filme diferente. Sua voz, que domina grande parte da narrativa, carrega o peso característico de sua presença magnética, mas há um tom cínico, quase desinteressado, em sua interpretação de William. Como apontado pelo Cineplayers, Hopkins parece "assistir de fora", como se soubesse que o material não está à altura de seu talento. Quando finalmente aparece em carne e osso, sua presença é imponente, mas o roteiro falha em dar complexidade ao seu vilão, reduzindo-o a um arquétipo de "justiceiro psicopata" que flerta com o maniqueísmo.

Temas e Mensagem

Confinado tenta abordar questões profundas, como desigualdade social, justiça pessoal e os limites do desespero. A crítica de classe é evidente na oposição entre Eddie, um trabalhador marginalizado, e William, um médico rico que usa sua riqueza e tecnologia para exercer poder sobre os "indesejáveis" da sociedade. A placa do Dolus, "18US3591", faz referência ao Título 18 do Código dos Estados Unidos, que trata de crimes puníveis com a morte, reforçando a ideia de William como um juiz autoproclamado.

No entanto, o filme hesita em explorar essas questões com profundidade. Como apontado pelo Plano Crítico, a narrativa flerta com debates sobre responsabilidade individual e desigualdade, mas recua para uma moral simplista: "roubar é errado, seja uma pessoa melhor". William, que poderia ser um vilão complexo movido por luto (sua filha foi vítima de um crime, o que justifica sua cruzada), é reduzido a um monstro unidimensional, enquanto Eddie, apesar de sua redenção no final, não passa por um arco de desenvolvimento convincente. O desfecho, com Eddie emergindo dos destroços do carro e decidindo ser um pai melhor ao comprar uma bicicleta para sua filha, é edificante, mas parece forçado e desconexo do tom sombrio do restante da obra.

Comparações e Originalidade

Como refilmagem, Confinado sofre ao ser comparado ao original argentino 4x4 e à versão brasileira A Jaula. Críticas sugerem que essas produções entenderam melhor o contexto social que pretendiam retratar, enquanto a versão americana se contenta com uma abordagem mais genérica e comercial. A influência de filmes como Por um Fio (2002) e Jogos Mortais é evidente, mas Confinado não consegue replicar a tensão contínua do primeiro ou a complexidade moral do segundo. A tecnologia do "Dolus", embora impressionante, levanta questionamentos sobre plausibilidade — como a resistência de Eddie a dias de desidratação e tortura — que enfraquecem a imersão.

Minha Conclusão Final

Confinado é um thriller que acerta em criar uma atmosfera claustrofóbica e em extrair atuações competentes de seu elenco, mas falha em cumprir as promessas de sua premissa. O filme começa com potencial, apoiado por uma direção visualmente eficiente e uma ideia cativante, mas se perde em repetições, diálogos fracos e uma resolução que sacrifica profundidade por moralismo. É um entretenimento funcional para quem busca tensão e suspense, mas deixa a sensação de uma oportunidade desperdiçada, especialmente com talentos como Hopkins e Skarsgård e um produtor como Sam Raimi envolvidos.

Nota: 3/5

A nota reflete o equilíbrio entre os méritos técnicos e as atuações, que mantêm o filme envolvente, e as falhas do roteiro, que impedem uma exploração mais profunda dos temas e personagens. Confinado é divertido e tenso em momentos pontuais, mas não deixa marcas duradouras, ficando aquém do que poderia ter sido. Recomendado para fãs de thrillers psicológicos que não se importem com uma narrativa que prioriza impacto imediato em vez de substância.

Nosferatu (2024)

Minha Crítica: Nosferatu (2024) – A Sombra de Robert Eggers Sobre o Vampiro Eterno

Mais de um século após o icônico Nosferatu: Eine Symphonie des Grauens (1922), de F.W. Murnau, e quase meio século depois da reinterpretação de Werner Herzog, o cineasta Robert Eggers assume a tarefa monumental de revisitar o vampiro mais grotesco e primordial do cinema. Nosferatu (2024) é, ao mesmo tempo, uma reverência ao expressionismo alemão, uma expansão do mito gótico e uma exploração profundamente autoral das obsessões humanas e do mal encarnado. Com um elenco estelar liderado por Bill Skarsgård, Lily-Rose Depp e Nicholas Hoult, e uma estética visual que se tornou marca registrada de Eggers, o filme é uma obra que impressiona, perturba e, por vezes, desafia as expectativas. Mas será que essa nova iteração consegue se destacar como uma reinvenção ousada ou permanece à sombra de seus predecessores? Vamos dissecar essa jornada sombria.

A Atmosfera: Um Pesadelo Visual e Sonoro

Robert Eggers é conhecido por sua obsessão com a autenticidade histórica e a criação de atmosferas opressivas, e Nosferatu não é exceção. Ambientado na Alemanha de 1838, o filme mergulha o espectador em um mundo de superstições, sombras e decadência. A fotografia de Jarin Blaschke, colaborador habitual de Eggers, é um dos grandes trunfos da obra. Filmado em 35mm com uma paleta dessaturada, o visual evoca tanto o cinema mudo quanto as pinturas românticas do século XIX, com tons de cinza, azul e vermelho sangue que reforçam o clima de melancolia e terror. Cenas como a silhueta de Orlok projetada contra as paredes de Wisborg ou a caminhada de Thomas Hutter por uma floresta coberta de neve são de uma beleza hipnótica, quase como quadros vivos.

O design de produção é igualmente meticuloso. O Castelo de Corvin, na Transilvânia, serve como um cenário perfeito para o lar de Orlok, com seus arcos góticos e corredores em ruínas que parecem pulsar com uma energia maligna. A cidade alemã de Wisborg, por sua vez, é claustrofóbica, com ruas estreitas e casas que parecem engolir a luz. Cada elemento – dos figurinos de época às velas tremeluzentes – contribui para a imersão total.

A trilha sonora de Robin Carolan é outro destaque. Longe dos clichês do horror, Carolan opta por uma abordagem minimalista e melancólica, com cordas dissonantes e coros etéreos que amplificam a sensação de desconforto. A música não apenas acompanha a narrativa, mas parece emanar do próprio Conde Orlok, como se sua presença infectasse o som ao seu redor. O uso de efeitos práticos, como os 5.000 ratos treinados que simbolizam a peste trazida pelo vampiro, reforça a fisicalidade do horror, tornando-o mais visceral.

A Narrativa: Entre o Clássico e o Contemporâneo

O enredo de Nosferatu (2024) segue a estrutura básica do original, mas com toques modernos que refletem a sensibilidade de Eggers. Thomas Hutter (Nicholas Hoult), um agente imobiliário, é enviado aos Cárpatos para negociar a compra de uma propriedade com o Conde Orlok (Bill Skarsgård). Desavisado, Thomas logo percebe que seu cliente é uma criatura das trevas, cuja obsessão por Ellen (Lily-Rose Depp), a esposa de Hutter, desencadeia uma onda de horror em Wisborg. A trama mantém os elementos centrais do filme de 1922, como o magnetismo sobrenatural entre o vampiro e sua vítima, mas aprofunda os temas de solidão, desejo reprimido e a luta contra forças incontroláveis.

Eggers, que também assina o roteiro, injeta uma camada de complexidade psicológica ausente no original. Ellen, em particular, é reimaginada como uma protagonista mais ativa e trágica. Longe de ser apenas uma vítima, ela é uma mulher atormentada por sonhos premonitórios e desejos conflitantes, que a conectam a Orlok de maneira quase erótica. Essa abordagem sensual, explorada com sutileza nas cenas de possessão e delírio, eleva o filme acima do simples terror, transformando-o em um melodrama gótico sobre a atração pelo proibido. A crítica social também está presente, especialmente na representação da “histeria” de Ellen, que reflete o tratamento misógino dispensado às mulheres com problemas mentais no século XIX.

No entanto, a narrativa não está isenta de falhas. Com 2 horas e 12 minutos, o filme sofre com um ritmo desigual. Algumas cenas, como as interações de Thomas com os habitantes locais da Transilvânia, se arrastam, enquanto outras, como o clímax em Wisborg, parecem apressadas. A expansão da mitologia do vampiro, com referências ao folclore do Leste Europeu, é fascinante, mas por vezes confusa, deixando algumas perguntas sem resposta. Comparado aos trabalhos anteriores de Eggers, como A Bruxa (2015) e O Farol (2019), Nosferatu parece menos coeso, como se o peso de adaptar um clássico tivesse comprometido a clareza da visão do diretor.

As Atuações: Um Elenco em Sintonia com o Gótico

O elenco de Nosferatu é um dos seus maiores acertos. Bill Skarsgård, conhecido por interpretar Pennywise em It: A Coisa, entrega uma performance irreconhecível como Conde Orlok. Sob camadas de maquiagem impressionantes (que levaram 9 horas para serem aplicadas), Skarsgård cria um vampiro que é ao mesmo tempo aterrorizante e pateticamente humano. Sua voz, trabalhada minuciosamente durante semanas, é grave e gutural, evocando uma criatura que não pertence ao mundo dos vivos. Orlok, nesta versão, é menos um demônio e mais um predador movido por um desejo insaciável, cuja obsessão por Ellen beira o trágico. Cada aparição do vampiro é carregada de magnetismo, especialmente nas cenas em que ele se move como uma sombra, desafiando as leis da física.

Lily-Rose Depp, como Ellen Hutter, é a alma do filme. Sua atuação combina fragilidade e intensidade, capturando a dualidade de uma mulher dividida entre o dever matrimonial e a atração pelo desconhecido. As cenas de possessão, em que Ellen parece lutar contra seu próprio corpo, são impressionantes, exigindo um domínio físico que Depp executa com maestria. Sua química com Skarsgård é palpável, mesmo que os dois compartilhem poucas cenas juntos, reforçando o tema do magnetismo sobrenatural.

Nicholas Hoult, como Thomas Hutter, oferece uma performance sólida, mas menos memorável. Seu personagem, um homem comum pego em circunstâncias extraordinárias, serve como âncora para a narrativa, mas carece da profundidade de Ellen ou Orlok. Aaron Taylor-Johnson, como Friedrich Harding, e Willem Dafoe, como o excêntrico Professor Albin Eberhart Von Franz, trazem carisma aos papéis secundários, com Dafoe roubando cenas com sua mistura de humor e gravidade. Emma Corrin, Ralph Ineson e Simon McBurney completam o elenco com atuações competentes, embora seus personagens tenham menos espaço para brilhar.

O Legado: Uma Releitura que Honra, mas Não Supera

Nosferatu (2024) é, sem dúvida, uma das adaptações mais ambiciosas do clássico de Murnau. Eggers honra o original ao preservar sua essência expressionista e sua atmosfera de pavor, mas também imprime sua própria marca, com uma abordagem que combina horror psicológico, melodrama e crítica social. A decisão de filmar em locações reais, como o Castelo de Corvin, e de usar efeitos práticos, como os ratos e a maquiagem de Orlok, reforça o compromisso do diretor com a autenticidade.

No entanto, o filme não alcança a mesma força eloquente do original ou a beleza austera do remake de Herzog (1979). Parte disso se deve às expectativas elevadas: Eggers, com apenas quatro longas-metragens, já é considerado um mestre do horror, e Nosferatu carrega o peso de ser sua obra mais comercial até agora. Comparado a A Bruxa ou O Farol, que são mais originais e coesos, Nosferatu parece menos inovador, como se Eggers estivesse preso entre a reverência ao clássico e o desejo de criar algo novo. A falta de uma novidade radical, como a que Luca Guadagnino trouxe a Suspiria (2018), faz com que o filme, embora excelente, não transcenda seus predecessores.

Minhas Considerações Finais

Nosferatu (2024) é um espetáculo gótico que combina beleza, horror e melancolia em doses generosas. Robert Eggers prova mais uma vez sua habilidade em criar mundos imersivos e personagens complexos, enquanto Bill Skarsgård e Lily-Rose Depp entregam performances que elevam o material. Apesar de suas falhas – um ritmo desigual e uma narrativa que nem sempre encontra seu foco –, o filme é uma experiência cinematográfica inesquecível, especialmente em uma sala de cinema, onde sua grandiosidade visual e sonora pode ser plenamente apreciada.

Para os fãs de Eggers e do horror gótico, Nosferatu é uma obra-prima imperfeita, que respeita o legado do original enquanto explora novas facetas do mito do vampiro. Para aqueles que esperavam uma reinvenção radical, o filme pode parecer um exercício de estilo, belo, mas não revolucionário. Ainda assim, sua capacidade de hipnotizar, perturbar e emocionar faz dele um dos grandes filmes de terror de 2024.

Nota: 4/5

O filme perde um ponto por sua falta de coesão narrativa e inovação em relação aos predecessores, mas sua ambição e execução técnica são dignas de aplausos.

Segunda Temporada de The Last of Us Foi um Fiasco?


Minha Crítica: A Segunda Temporada de The Last of Us – Uma Jornada Intensa, mas Desigual

A segunda temporada de The Last of Us, exibida pela HBO entre abril e maio de 2025, chegou com o peso de suceder uma estreia aclamada, que em 2023 redefiniu o padrão para adaptações de videogames. Baseada na primeira metade de The Last of Us Part II (2020), a nova temporada mantém a ambição visual e emocional da série, mas tropeça em escolhas narrativas que diluem o impacto de sua história complexa e, por vezes, ousada. Com sete episódios, a temporada explora temas como vingança, trauma e a fragilidade da humanidade em um mundo pós-apocalíptico, mas deixa a sensação de que poderia ter sido mais corajosa e coesa. A seguir, mergulho nos acertos, falhas e nuances dessa jornada, com spoilers leves (devidamente sinalizados quando necessário).

Contexto e Expectativas

A primeira temporada de The Last of Us conquistou críticos e público ao traduzir a narrativa íntima do jogo original para a televisão, com atuações memoráveis de Pedro Pascal (Joel) e Bella Ramsey (Ellie), uma direção impecável e uma cenografia que trouxe à vida o mundo devastado pela infecção fúngica. A segunda temporada, inspirada em The Last of Us Part II, enfrentava um desafio maior: adaptar um jogo conhecido por sua narrativa polarizante, que divide a perspectiva entre Ellie e Abby, e por decisões ousadas que subvertem expectativas. Com Craig Mazin e Neil Druckmann novamente no comando, a expectativa era que a série mantivesse a fidelidade emocional ao material original, mas com ajustes para o formato televisivo.

A temporada começa cinco anos após os eventos da primeira, com Joel e Ellie vivendo em Jackson, Wyoming, uma comunidade que oferece um raro vislumbre de normalidade. No entanto, um evento traumático (evito detalhes para quem não jogou ou assistiu) desencadeia uma jornada de vingança que testa os limites morais dos personagens. A introdução de Abby (Kaitlyn Dever), uma figura central do jogo, promete expandir a narrativa, mas a decisão de focar majoritariamente em Ellie nesta temporada, reservando a perspectiva de Abby para a terceira, gera um desequilíbrio que permeia os episódios.

Pontos Fortes: Atuações, Produção e Momentos de Brilho

The Last of Us continua sendo um marco técnico. A direção de arte recria com fidelidade cenários como Jackson e Seattle, com detalhes que imergem o espectador no mundo pós-apocalíptico – desde prédios cobertos por vegetação até os infectados, cuja maquiagem e efeitos visuais são de tirar o fôlego. A trilha sonora de Gustavo Santaolalla, com seus acordes melancólicos, amplifica a emoção, enquanto a fotografia captura tanto a beleza quanto a brutalidade do ambiente. Sequências de ação, como ataques de hordas de infectados, são tensas e bem coreografadas, mantendo o espectador à beira do assento.

As atuações são, sem dúvida, o coração da temporada. Bella Ramsey entrega uma Ellie mais madura, mas profundamente ferida, navegando entre raiva, luto e vulnerabilidade. Sua performance em momentos de confronto emocional – especialmente nos flashbacks com Joel – é devastadora, provando que Ramsey é a escolha perfeita para o papel, apesar das críticas iniciais de fãs do jogo. Pedro Pascal, mesmo com menos tempo de tela, imbui Joel com uma ternura que contrasta com sua dureza de sobrevivente, tornando cada cena com ele um lembrete do quanto sua presença é essencial. Kaitlyn Dever, como Abby, brilha nos poucos momentos que lhe são dados, trazendo uma intensidade que promete muito para a terceira temporada. Isabela Merced (Dina) e Gabriel Luna (Tommy) também se destacam, embora seus personagens sejam subutilizados em alguns episódios.

Os flashbacks, especialmente no penúltimo episódio, são os pontos altos da temporada. Essas cenas, que exploram a relação entre Joel e Ellie nos anos entre as duas temporadas, oferecem um respiro emocional e adicionam camadas à narrativa. Um momento particular no museu espacial, onde Joel tenta reconectar Ellie com um mundo de sonhos perdidos, é de uma beleza agridoce que ecoa o melhor da primeira temporada. Esses instantes mostram que, quando a série foca na intimidade dos personagens, ela é imbatível.


Pontos Fracos: Ritmo, Estrutura e Escolhas Narrativas

Apesar de seus méritos, a segunda temporada sofre com problemas de ritmo e estrutura. A decisão de dividir The Last of Us Part II em duas temporadas faz sentido, dado o tamanho e a complexidade do jogo, mas resulta em uma narrativa que parece incompleta. Ao focar quase exclusivamente em Ellie, a série adia a dualidade entre ela e Abby, que é o cerne do jogo. Isso torna a temporada menos ambiciosa do que poderia ser, já que a ausência da perspectiva de Abby limita a exploração de temas como empatia e o ciclo de violência. A escolha de revelar as motivações de Abby logo no primeiro episódio, ao contrário do jogo, que as desvela gradualmente, também diminui o impacto de sua história.
 
O evento traumático que desencadeia a jornada de Ellie – a morte de Joel no segundo episódio – é executado com brutalidade, mas de forma apressada. A série tenta combinar esse momento íntimo e devastador com uma invasão de infectados em Jackson, o que dilui o peso emocional. No jogo, a morte de Joel é um soco no estômago porque o jogador a vivencia em detalhes; na série, a pressa para avançar a trama prejudica o luto de Ellie e do espectador. Além disso, a ausência de Joel nos episódios seguintes deixa um vazio que a série não consegue preencher completamente, apesar do esforço de Ramsey e Merced.

O ritmo irregular também é um problema. Os três primeiros episódios são intensos, mas os capítulos intermediários se perdem em desvios narrativos que não desenvolvem os personagens secundários, como Jesse (Young Mazino) e Tommy, de forma satisfatória. A jornada de Ellie e Dina em Seattle, por exemplo, é marcada por momentos de ação, mas carece da introspecção que dava profundidade ao jogo. A série suaviza a brutalidade de Ellie, humanizando-a em excesso, o que reduz o impacto de sua transformação em uma figura consumida pela vingança. Essa escolha, criticada por alguns fãs em posts no X, reflete uma hesitação em abraçar a crueldade do material original, o que enfraquece a narrativa.

O final da temporada, intitulado “Convergência”, é outro ponto de controvérsia. Embora deixe um gancho para a terceira temporada, o episódio não oferece um senso de clímax ou resolução, parecendo mais um capítulo intermediário do que uma conclusão. A abordagem fragmentada, com múltiplos núcleos narrativos, impede que o desfecho tenha o peso emocional necessário. Como apontado pela Rolling Stone Brasil, o final parece “insatisfatório” por não amarrar os arcos de forma coesa, deixando o espectador com mais perguntas do que respostas.

Temas e Relevância

The Last of Us sempre foi mais do que uma história de zumbis; é um estudo sobre o que nos torna humanos em um mundo onde a sobrevivência exige escolhas impossíveis. A segunda temporada explora a vingança como um ciclo autodestrutivo, mas sua abordagem é menos incisiva do que no jogo. A série tenta humanizar Ellie ao suavizar suas ações, mas isso a torna menos complexa, já que o jogo a apresenta como uma figura moralmente ambígua. A ausência da perspectiva de Abby também limita a discussão sobre justiça e empatia, que são centrais ao material original.

Ainda assim, a temporada acerta ao abordar o luto e o trauma. Ellie, em particular, é um retrato poderoso de alguém preso entre a dor e a busca por propósito. Sua relação com Dina oferece momentos de leveza, mas também reforça a ideia de que o amor não é suficiente para curar feridas profundas. A série também merece elogios por sua representação inclusiva, com personagens como Dina e Ellie trazendo naturalidade à diversidade em um mundo pós-apocalíptico.

Comparação com o Jogo e Recepção

Comparar a série ao jogo é inevitável, mas injusto em alguns aspectos. O formato televisivo exige ajustes, e a primeira temporada provou que mudanças podem funcionar – como a expansão da história de Bill e Frank. Na segunda temporada, porém, algumas alterações, como a introdução precoce de Abby e a suavização de Ellie, não têm o mesmo sucesso. A recepção da crítica, com 93% no Rotten Tomatoes e 82/100 no Metacritic, reflete a qualidade técnica, mas a queda na aprovação do público (39% no Rotten Tomatoes) indica uma divisão, especialmente entre fãs do jogo que sentiram falta da ousadia narrativa.

Posts no X, como os do @IGNBrasil e @omelete, ecoam essa insatisfação, apontando que a temporada é “uma casca vazia” em comparação ao jogo e que “ameniza” Ellie de forma problemática. Essa divisão reflete o desafio de adaptar um material tão controverso, mas também sugere que Mazin e Druckmann poderiam ter sido mais fiéis à essência sombria do jogo.

Minha Conclusão Final

A segunda temporada de The Last of Us é uma experiência visualmente deslumbrante e emocionalmente intensa, sustentada por atuações excepcionais e momentos de brilhantismo. No entanto, seu ritmo irregular, escolhas narrativas hesitantes e a ausência da dualidade Ellie-Abby a tornam menos impactante do que a primeira temporada e o jogo que a inspira. A série parece recuar quando deveria arriscar, suavizando a crueldade que define The Last of Us Part II. Ainda assim, ela mantém o espectador investido e pavimenta o caminho para uma terceira temporada que, espera-se, recupere a ousadia perdida.

Nota: 3,5/5

A temporada é boa, mas não atinge o patamar de excelência da estreia. É um capítulo de transição que, apesar de seus méritos, deixa a sensação de que poderia ter sido mais. Para fãs do jogo, é uma adaptação que exige paciência; para novos espectadores, é uma jornada envolvente, mas incompleta. Que a terceira temporada traga a coragem que faltou aqui.

Extermínio: A Evolução (28 Years Later) (2025)


Minha Crítica Extermínio: A Evolução (28 Years Later) (2025) – Uma Reinvenção Visceral que Tropeça na Própria Ambição

Após mais de duas décadas desde que Extermínio (2002) redefiniu o gênero zumbi com sua abordagem crua, frenética e visceral, Danny Boyle e Alex Garland retornam ao universo apocalíptico com Extermínio: A Evolução (28 Years Later), lançado em 19 de junho de 2025 no Brasil. Prometendo ser o início de uma nova trilogia, o filme carrega o peso de uma franquia icônica que não apenas revitalizou o subgênero zumbi, mas também influenciou obras como The Last of Us e The Walking Dead. Com um elenco estelar, uma estética experimental e uma narrativa que tenta equilibrar horror, drama humano e comentário social, Extermínio: A Evolução é uma obra ambiciosa que entrega momentos de brilhantismo, mas também se perde em suas próprias ideias, resultando em uma experiência que, embora memorável, não alcança o impacto radical do original.

Contexto e Premissa: Um Mundo Transformado

Extermínio: A Evolução se passa 28 anos após o surto inicial do vírus da raiva, que transformou o Reino Unido em um cenário de caos e isolamento. A nação permanece em quarentena, enquanto o resto do mundo segue uma normalidade distante. Nesse contexto, acompanhamos uma comunidade de sobreviventes que encontrou refúgio em uma ilha protegida por muralhas e uma passagem fortificada. A trama foca em uma família composta por Jamie (Aaron Taylor-Johnson), Isla (Jodie Comer) e seu filho de 12 anos, Spike (Alfie Williams), cuja jornada é desencadeada por uma missão ao continente que revela novos horrores, mutações e segredos sobre os infectados e os próprios sobreviventes.

O filme não é uma continuação direta dos eventos de Extermínio ou Extermínio 2 (2007), mas uma expansão do universo, explorando como a humanidade e o vírus evoluíram ao longo de quase três décadas. A ausência de Cillian Murphy como protagonista (embora ele atue como produtor executivo) é sentida, mas a escolha de centrar a narrativa em novos personagens, especialmente no jovem Spike, traz uma perspectiva fresca e emocional ao gênero.

Os Acertos: Estética, Atuações e Reflexões

Danny Boyle, conhecido por sua inquietação visual e experimentação, retorna com uma direção que reforça sua marca autoral. Extermínio: A Evolução é um espetáculo sensorial, filmado majoritariamente com iPhones 15 Pro Max, drones e câmeras digitais, remetendo à estética de vídeo caseiro do original, mas com uma textura moderna e imersiva. A fotografia de Anthony Dod Mantle, que também trabalhou no primeiro filme, captura as paisagens desoladas do norte da Inglaterra com uma beleza melancólica, contrastando com a brutalidade dos infectados. Cenas noturnas, especialmente aquelas com iluminação vermelha em visão noturna, criam uma atmosfera sufocante e memorável. A montagem frenética, com cortes rápidos e zooms abruptos, evoca o caos emocional dos personagens, enquanto a trilha sonora do trio Young Fathers, com sua mistura dissonante de punk rock e eletrônica, amplifica a tensão.

O roteiro de Alex Garland, por sua vez, continua a tradição da franquia de usar os infectados como metáfora para questões humanas. Aqui, ele explora a natureza hereditária da violência, o impacto de ritos e tradições em sociedades fragmentadas e a perda da inocência em um mundo hostil. A escolha de Rudyard Kipling como leitmotiv, com o poema Boots integrado à narrativa, reforça a ideia de um ciclo perpétuo de guerra e destruição, um tema que ressoa com o contexto global de 2025, marcado por pandemias recentes, polarização política e conflitos. A cena em que o poema é recitado, descrita como a mais poderosa do filme por críticos, é um exemplo de como Garland e Boyle elevam o gênero zumbi a um comentário filosófico.

O elenco é outro ponto alto. Aaron Taylor-Johnson entrega um Jamie complexo, um pai dividido entre proteger sua família e confrontar os horrores do continente. Jodie Comer, como Isla, é o coração emocional do filme, transmitindo força e vulnerabilidade em igual medida. Alfie Williams, em sua estreia como Spike, surpreende com uma atuação que captura a dualidade de uma criança forçada a amadurecer rápido demais, mas ainda guiada por impulsos genuínos. Ralph Fiennes, em um papel secundário como o enigmático Dr. Kelson, rouba a cena com uma performance que mistura excentricidade e humanidade, oferecendo um dos momentos mais emocionantes do filme.

Os Tropeços: Ambição Desequilibrada e Falta de Urgência

Apesar de seus méritos, Extermínio: A Evolução sofre com uma narrativa que tenta abraçar múltiplas ideias sem dar a todas o devido peso. O foco no drama familiar, embora emocionalmente envolvente, dilui a urgência e o horror que definiram o primeiro filme. Onde Extermínio (2002) era cru e implacável, com infectados que representavam uma ameaça constante, A Evolução opta por uma abordagem mais introspectiva, relegando os infectados a um papel secundário. Essa escolha, embora válida, frustra as expectativas de fãs que aguardavam o “horror visceral” prometido pela campanha de marketing.

Os novos infectados, apresentados como uma evolução do vírus com variantes mais inteligentes e grotescas, são visualmente impactantes, mas sua lógica no universo da franquia é questionável. Críticas apontam que essas mutações, inspiradas em The Last of Us, parecem desconexas do mundo estabelecido nos filmes anteriores, e algumas escolhas criativas, como a nudez completa dos infectados, geram mais distração do que medo. Além disso, o uso de jump scares baratos em detrimento de uma tensão mais sofisticada compromete a atmosfera em certos momentos.

O roteiro, embora rico em temas, peca por uma estrutura que lembra um videogame, com missões lineares e resoluções que nem sempre respeitam as regras do próprio mundo. A motivação inicial para a jornada dos protagonistas é descrita como “boba” por alguns críticos, e decisões questionáveis de certos personagens enfraquecem a imersão. O cliffhanger final, que prepara o terreno para a sequência Extermínio: O Templo dos Ossos (2026), divide opiniões: para alguns, é uma promessa empolgante de algo maior; para outros, reforça a sensação de que o filme é mais uma introdução do que uma obra completa.

Recepção e Impacto Cultural

A recepção crítica de Extermínio: A Evolução é mista, mas majoritariamente positiva, com 95% de aprovação no Rotten Tomatoes com base em 81 avaliações. Críticas elogiam a ousadia visual, as atuações e a profundidade temática, mas apontam que o filme não recaptura a força revolucionária do original. No Brasil, a imprensa destaca tanto o experimentalismo de Boyle quanto a falta de impacto do roteiro, com avaliações que variam de “filmaço visceral” a “bonito, mas vazio”. A bilheteria reflete o hype: o filme arrecadou cerca de US$ 56-60 milhões em sua estreia global, superando expectativas para um terror com orçamento de US$ 75 milhões.

Culturalmente, Extermínio: A Evolução chega em um momento oportuno, dialogando com ansiedades contemporâneas sobre pandemias, isolamento e a fragilidade da civilização. Sua abordagem sensorial e o uso de iPhones como ferramenta cinematográfica reforçam a ideia de um cinema que reflete a era digital, enquanto o foco em uma criança protagonista ecoa narrativas recentes como The Last of Us. No entanto, ao priorizar drama e poesia sobre horror, o filme aliena parte do público que esperava um retorno ao caos desenfreado do original.

Minhas Considerações Finais: Um Novo Capítulo com Potencial Inexplorado

Extermínio: A Evolução é uma obra que reflete a maturidade de Danny Boyle e Alex Garland, mas também os desafios de revisitar um clássico em um mundo saturado de histórias apocalípticas. É um filme que impressiona pela estética, emociona com suas performances e provoca com suas reflexões, mas falha em recapturar a urgência e o impacto que fizeram de Extermínio um marco. Como o primeiro capítulo de uma trilogia, ele estabelece um universo intrigante e deixa portas abertas para explorações futuras, mas não se sustenta completamente como uma obra autônoma.

Para fãs da franquia, é uma experiência que vale pela nostalgia e pela promessa do que está por vir. Para novos espectadores, oferece uma visão única do gênero zumbi, mas pode decepcionar aqueles que buscam sustos constantes. No fim, Extermínio: A Evolução é um filme corajoso, imperfeito e profundamente humano – uma evolução, sim, mas que ainda busca encontrar seu lugar no legado da série. 

Nota: 4/5

Essa avaliação reflete os pontos fortes do filme, como a direção ousada de Danny Boyle, as atuações marcantes de Aaron Taylor-Johnson, Jodie Comer e Alfie Williams, a estética sensorial e os temas profundos explorados por Alex Garland. No entanto, a nota não alcança o 5 devido a falhas como a narrativa desequilibrada, a falta de urgência em comparação com o original e alguns elementos que não se integram bem ao universo da franquia, como as mutações dos infectados e o uso de jump scares. 

É um filme impressionante, mas com potencial parcialmente inexplorado.

O Eternauta (2025)

Minha Crítica : O Eternauta (Netflix, 2025)

A série O Eternauta, lançada pela Netflix em 30 de abril de 2025, é uma adaptação ambiciosa da icônica história em quadrinhos argentina criada por Héctor Germán Oesterheld e ilustrada por Francisco Solano López, publicada originalmente entre 1957 e 1959. Com seis episódios dirigidos por Bruno Stagnaro e estrelados por Ricardo Darín no papel de Juan Salvo, a produção se propõe a trazer para o streaming uma narrativa que mistura ficção científica apocalíptica, crítica social e um profundo estudo sobre a condição humana em tempos de crise. A obra original é um marco cultural na América Latina, carregada de simbolismo político e reflexões sobre resistência e coletividade, e a série enfrenta o desafio de honrar esse legado enquanto se adapta a um público global contemporâneo. Após assistir à primeira temporada, esta crítica busca explorar os méritos e as falhas da produção, analisando sua narrativa, aspectos técnicos, atuações, fidelidade à fonte e relevância cultural, culminando em uma avaliação final.

Contexto e Enredo: Um Apocalipse Argentino

A série se passa em uma Buenos Aires contemporânea, assolada por uma nevasca tóxica que mata instantaneamente qualquer pessoa que entre em contato com ela. Juan Salvo (Ricardo Darín), um homem comum com um passado marcado pela Guerra das Malvinas, sobrevive ao lado de um pequeno grupo de amigos e familiares, enquanto tenta entender a natureza da catástrofe. O que inicialmente parece um fenômeno climático logo se revela como o primeiro estágio de uma invasão alienígena, conduzida por uma força invisível chamada "Mão" nos quadrinhos. A narrativa acompanha a luta desesperada desse grupo por sobrevivência, enquanto enfrentam não apenas os perigos externos — como os insetos gigantes controlados pelos invasores — mas também os conflitos internos, como desconfiança, trauma e a fragilidade das relações humanas em um cenário de colapso social.

A escolha de atualizar a história para os dias atuais, em vez de manter o contexto dos anos 1950, é uma decisão ousada que reflete tanto os desafios de produção quanto a intenção de tornar a trama mais acessível. A HQ original, escrita durante a Guerra Fria, era impregnada de temores de ataques nucleares e críticas veladas ao autoritarismo, que ganharam um tom mais explícito na reedição de 1969. Na série, a modernização traz novos elementos, como o uso de celulares (antes que a energia colapse) e referências à Guerra das Malvinas, mas também arrisca diluir o peso político específico da obra de Oesterheld, que era profundamente enraizada na história argentina.

Pontos Fortes: Produção, Atuações e Atmosfera

Um dos maiores trunfos de O Eternauta é sua realização técnica. Filmada em Buenos Aires com a tecnologia StageCraft (a mesma usada em The Mandalorian), a série apresenta cenários apocalípticos impressionantes, com ruas cobertas de neve, veículos abandonados e uma paleta de cores que reforça a sensação de desolação. A neve, que raramente ocorre na capital argentina, é usada como um elemento visual poderoso, criando uma atmosfera claustrofóbica e opressiva. O design de produção é meticuloso, e os efeitos visuais, embora não sejam perfeitos em todos os momentos, são surpreendentemente competentes para um orçamento estimado em 15 milhões de dólares. Os insetos alienígenas, inspirados nos besouros da HQ, têm um visual que respeita a fonte, com uma textura orgânica que evita o artificialismo de muitas produções de ficção científica.

A direção de Bruno Stagnaro, conhecido por Okupas, é outro destaque. Stagnaro opta por um ritmo deliberadamente lento nos primeiros episódios, construindo a tensão de forma gradual e permitindo que o público se conecte com os personagens antes de revelar a verdadeira escala da ameaça. Essa escolha pode frustrar quem busca ação imediata, mas é eficaz em criar um senso de realismo e imersão. A partir do quarto episódio, quando os elementos fantásticos ganham mais espaço, a série encontra um equilíbrio entre o drama humano e a ficção científica, culminando em um final que, embora aberto, deixa o espectador ansioso pela segunda temporada já confirmada.

Ricardo Darín, como Juan Salvo, é a alma da série. Sua performance é contida, mas profundamente expressiva, transmitindo o peso de um homem comum forçado a liderar em circunstâncias extremas. Mesmo escondido por máscaras de proteção em várias cenas, Darín usa o olhar e a linguagem corporal para conveyer angústia, determinação e vulnerabilidade. O elenco de apoio também brilha, com destaque para César Troncoso como Favalli, cuja racionalidade técnica contrasta com a empatia de outros personagens, e Mora Fisz como Clara, cuja jornada levanta questões perturbadoras sobre controle alienígena. No entanto, Carla Peterson, que interpreta Elena, a esposa de Juan, parece menos à vontade em momentos dramáticos, o que gera uma leve desconexão em cenas familiares.

A série também merece elogios por manter o tema central da HQ: a força da coletividade. Em um mundo cada vez mais individualista, O Eternauta reforça a mensagem de que "ninguém se salva sozinho", mostrando como a solidariedade, mesmo em meio à desconfiança, é essencial para enfrentar adversidades. Essa ideia ressoa tanto no contexto ficcional quanto no atual, especialmente em tempos de polarização e crises globais.

Pontos Fracos: Perda de Nervo Político e Ritmo Irregular

Apesar de seus méritos, O Eternauta não está isenta de falhas. A principal crítica é a atenuação do caráter político da obra original. A HQ de Oesterheld, especialmente em sua versão de 1969, era uma denúncia explícita contra o autoritarismo, o imperialismo e as desigualdades sociais, escrita por um autor que pagou com a vida por sua militância contra a ditadura argentina. Na série, esses elementos aparecem de forma mais sutil, como na menção à Guerra das Malvinas ou na crítica implícita à fragilidade das instituições em crises. No entanto, a busca por uma narrativa "universal" para agradar ao público global resulta em uma perda de especificidade cultural e histórica, o que enfraquece a conexão com a memória coletiva argentina. A ausência de um comentário mais direto sobre a ditadura ou sobre as feridas ainda abertas do país, como os desaparecimentos forçados, é uma oportunidade perdida, especialmente considerando a trágica história de Oesterheld e suas filhas.

Outro ponto de crítica é o ritmo irregular. Os primeiros três episódios, focados na construção dos personagens e na ambientação, podem parecer arrastados para quem não está familiarizado com a HQ ou espera uma narrativa mais acelerada. O segundo e o quinto episódios, em particular, sofrem com momentos de exposição excessiva ou subtramas que não avançam significativamente a história. Embora o ritmo melhore na segunda metade, a série poderia se beneficiar de uma edição mais enxuta para manter a tensão constante.

Por fim, algumas escolhas narrativas, como os "apagões" de Juan Salvo, sugerem elementos de viagem no tempo ou loops temporais que não são plenamente explorados na primeira temporada. Embora isso crie expectativa para a continuação, também deixa uma sensação de incompletude, especialmente para espectadores que não conhecem a HQ e podem achar o final abrupto ou confuso.

Fidelidade à HQ e Relevância Cultural

A adaptação de O Eternauta é fiel ao espírito da HQ, mas toma liberdades criativas que dividem opiniões. A modernização da história, a inclusão de novos personagens e a alteração de certos eventos são justificáveis pela mudança de mídia e pelo desejo de atualizar a narrativa. No entanto, fãs puristas podem se incomodar com a ausência de algumas cenas icônicas ou com a redução do tom político explícito. Ainda assim, a série preserva elementos centrais, como a neve tóxica, os besouros alienígenas e a transformação de Juan em um símbolo de resistência, além de homenagear a estética de Solano López em detalhes visuais.

Culturalmente, O Eternauta é um marco para a Argentina e a América Latina. A série coloca Buenos Aires como o epicentro de uma narrativa apocalíptica, desafiando a tendência de produções sci-fi centradas em cidades do "primeiro mundo". Para os argentinos, ver suas ruas e costumes representados em uma produção de alto nível é motivo de orgulho, como refletido em comentários de fãs no IMDb e em posts no X. Globalmente, a série introduz uma obra seminal da ficção latino-americana a novos públicos, destacando a relevância de histórias que combinam entretenimento com reflexão social.

Minha Conclusão Final, Considerações Finais e Nota

O Eternauta é uma adaptação que impressiona pela qualidade técnica, pelas atuações (com destaque para Darín) e pela capacidade de criar uma atmosfera envolvente. A série honra o legado da HQ ao enfatizar a importância da coletividade e da resistência, mas perde força ao suavizar o nervo político que fazia da obra original um grito de denúncia. O ritmo irregular e algumas pontas soltas narrativas são contrabalançados por momentos de tensão bem construídos e por um final que promete expandir a mitologia na segunda temporada.

Como uma produção latino-americana que compete com blockbusters globais, O Eternauta é uma vitória, demonstrando que é possível contar histórias locais com alcance universal. No entanto, sua hesitação em abraçar plenamente o contexto político e histórico da Argentina impede que alcance o impacto transformador da HQ. Ainda assim, é uma série que merece ser vista, tanto por fãs da obra original quanto por quem busca uma ficção científica com alma e coração.

Nota: 4/5

A série é poderosa e emocionante, mas deixa margem para crescer em ousadia e profundidade na próxima temporada. Que a resistência de Juan Salvo inspire não apenas os personagens, mas também os roteiristas a recuperarem o espírito combativo de Oesterheld.

Ash - Planeta Parasita (2025)

Minha Crítica: Ash: Planeta Parasita (2025)

Ash: Planeta Parasita, dirigido pelo estreante Flying Lotus (nome artístico de Steven Ellison), é uma incursão ambiciosa no terror cósmico e na ficção científica que tenta, com unhas e dentes, se destacar em um gênero saturado de clássicos imponentes como Alien: O Oitavo Passageiro (1979) e O Enigma de Outro Mundo (1982). Lançado em 24 de abril de 2025 no Prime Video, o filme traz Eiza González como Riya, uma cientista espacial que desperta em uma estação orbital com um ferimento na testa, sem memória e cercada pelos corpos brutalmente assassinados de sua tripulação. A chegada de Brion (Aaron Paul), um suposto resgatista, desencadeia uma narrativa de mistério, paranoia e horror psicológico que, embora visualmente cativante, tropeça em sua própria ambição, resultando em uma experiência que é ao mesmo tempo intrigante e frustrante. 

Atmosfera e Estilo Visual: Um Banquete Sensorial com Limitações

Um dos pontos mais fortes de Ash: Planeta Parasita é, sem dúvida, sua estética. Flying Lotus, conhecido por sua carreira na música experimental, imprime ao filme uma identidade visual que remete a um videoclipe psicodélico. A fotografia de Richard Bluck utiliza tons neon — azuis, roxos, verdes e vermelhos — para criar uma atmosfera onírica e claustrofóbica, reforçada por luzes estroboscópicas e closes abruptos que evocam desconforto. A trilha sonora, também assinada por Lotus, é um destaque à parte, com camadas de sons eletrônicos e dissonantes que elevam momentos de tensão a um patamar quase fantasmagórico. Há sequências, como a apresentação do título em uma mandala formada por gases atmosféricos, que são de uma beleza hipnótica e demonstram o potencial do diretor em criar imagens memoráveis.

No entanto, essa estilização, embora impressionante, frequentemente parece desconectada da narrativa. O excesso de efeitos visuais e a edição ritmada de Bryan Shaw, que prioriza cortes rápidos e transições abruptas, acabam minando a construção de tensão. O que deveria ser um pesadelo imersivo muitas vezes se transforma em um desfile de imagens impactantes, mas narrativamente vazias. A sensação é de que Lotus está mais interessado em impressionar visualmente do que em sustentar uma história coesa, o que faz o filme parecer, em momentos, um experimento estético em vez de uma obra cinematográfica completa.

Enredo e Roteiro: Ambição Sufocada por Falhas de Execução

O roteiro de Jonni Remmler parte de uma premissa instigante: Riya, desmemoriada, tenta desvendar o que aconteceu com sua tripulação enquanto lida com a possibilidade de estar infectada por uma entidade alienígena. A narrativa flerta com temas profundos, como a exploração colonial humana, a manipulação psicológica (gaslighting) e o horror existencial de não saber quem se é. A ideia de um parasita que distorce a percepção da realidade, infiltrando-se na mente e no corpo, é rica e poderia render um estudo psicológico poderoso.

Porém, o filme não consegue capitalizar esse potencial. A estrutura narrativa, que alterna entre flashbacks expositivos e momentos de tensão no presente, é desajeitada. Os flashbacks, em vez de aprofundarem o mistério, entregam respostas de forma didática, dissipando a ambiguidade que poderia ter sustentado a paranoia da protagonista. O grande plot twist — a revelação de que Riya é responsável pelas mortes, manipulada pelo parasita — é previsível e chega cedo demais, minando a suspense. Além disso, a ameaça alienígena é genérica, com um design que remete a clichês do gênero (tentáculos, corpos deformados) sem oferecer nada de novo. O filme tenta emular a tensão de Alien e a desconfiança de O Enigma de Outro Mundo, mas carece da urgência e da originalidade que tornaram esses clássicos atemporais.

A resolução, com Riya enfrentando a criatura em uma batalha final com um lança-chamas, é funcional, mas previsível, e a cena pós-créditos, que sugere a sobrevivência do parasita, parece mais um aceno forçado a uma possível sequência do que uma adição significativa à narrativa. O filme termina com a sensação de que prometeu mais do que entregou, deixando questões interessantes — como a crítica à colonização espacial — na superfície, sem exploração profunda.

Atuações: Um Elenco Talentoso Preso a Personagens Rasos

Eiza González entrega uma performance sólida como Riya, capturando a vulnerabilidade e a determinação de uma protagonista à beira da sanidade. Sua tentativa de emular a icônica Ellen Ripley é evidente, e ela consegue transmitir momentos de angústia genuína, especialmente nas cenas em que confronta suas memórias fragmentadas. No entanto, o roteiro não lhe dá material suficiente para explorar camadas mais profundas, e em momentos de maior intensidade emocional, sua atuação parece forçada, como se lutasse contra a direção inconsistente.

Aaron Paul, como Brion, é funcional, mas subutilizado. Sua presença traz um peso dramático inicial, mas o personagem se revela unidimensional, servindo mais como um dispositivo narrativo do que como uma figura complexa. A química entre González e Paul é praticamente inexistente, o que enfraquece a dinâmica de desconfiança mútua que o filme tenta estabelecer. Outros membros do elenco, como Iko Uwais e Kate Elliott, têm participações tão breves que mal deixam marca, uma pena considerando o talento envolvido.

Referências e Originalidade: Um Tributo que Não Inova

Ash: Planeta Parasita é descaradamente derivativo, bebendo de forma explícita de Alien e O Enigma de Outro Mundo. A protagonista desmemoriada, a estação espacial claustrofóbica, o parasita que controla mentes — todos esses elementos são familiares, e o filme não faz questão de escondê-los. Há momentos que parecem cópias diretas, como cenas de procedimentos médicos assistidos por robôs que ecoam 2001: Uma Odisseia no Espaço ou Prometheus. Embora Flying Lotus tente injetar uma perspectiva autoral com sua estética psicodélica, o filme nunca transcende suas referências para se tornar algo verdadeiramente novo.

Essa falta de originalidade é especialmente frustrante porque o filme acena para ideias provocadoras — como a consciência coletiva do parasita que rejeita a colonização humana — mas não as desenvolve. O resultado é uma obra que parece um pastiche, mais preocupada em prestar homenagem do que em forjar sua própria identidade. Comparado a outros filmes recentes de terror sci-fi, como Não! Não Olhe! (2022) ou até mesmo a animação Looney Tunes: O Dia em que a Terra Explodiu (2024), Ash carece do frescor ou da irreverência necessários para se destacar.

Impacto e Recepção

Apesar de suas falhas, Ash: Planeta Parasita encontrou certo sucesso no Prime Video, alcançando o topo dos mais assistidos em 19 países, segundo o Flixpatrol. Sua bilheteria, no entanto, foi um fracasso, arrecadando apenas US$ 1,08 milhão mundialmente. As críticas são mistas: enquanto alguns elogiam a atmosfera e a ousadia visual (73% no Rotten Tomatoes), outros apontam a narrativa desconexa e a falta de impacto emocional. O filme parece dividir opiniões entre aqueles que apreciam sua experimentação e os que se sentem decepcionados por sua execução desleixada.

Minha Conclusão Final: Um Experimento Promissor, Mas Incompleto

Ash: Planeta Parasita é um filme que seduz pela forma, mas decepciona pelo conteúdo. Flying Lotus demonstra potencial como diretor, com uma visão estética única e uma trilha sonora envolvente, mas sua inexperiência no formato de longa-metragem é evidente na falta de coesão narrativa e na incapacidade de sustentar a tensão. O elenco, liderado por Eiza González, faz o possível com um roteiro que não explora todo o seu potencial, e as referências a clássicos do gênero, embora respeitosas, acabam pesando contra a originalidade da obra. É uma pena, porque há lampejos de algo especial aqui — momentos em que o filme quase se torna o pesadelo cósmico que promete ser. No final, porém, ele se contenta em ser um exercício de estilo, mais próximo de um videoclipe estendido do que de um marco do terror sci-fi.

Nota: 2,5/5

O filme merece crédito por sua ambição visual e pela tentativa de Flying Lotus de trazer sua voz autoral ao gênero, mas suas falhas narrativas e a falta de impacto emocional o impedem de alcançar o nível dos clássicos que referencia. É uma experiência que vale a pena para fãs de terror psicológico e sci-fi experimental, mas aqueles que buscam uma história envolvente ou sustos memoráveis provavelmente sairão desapontados.